Não tem aquele livro que faz a pessoa mudar de rumo? Pois a história do caçador mongol, exemplo de humildade e sabedoria, contada pelo explorador e escritor russo Vladimir Arsenyev, e recontada no cinema, de forma encantadora, pelo mestre Akira Kurosawa, me deu outra visão de mundo, me fez outra pessoa. Sem exagero.
Já havia lido o livro de mesmo título quando assisti “Dersu Uzala” numa das primeiras viagens que fiz ao Rio de Janeiro. Na volta, comecei a refletir sobre os meus valores e desembarquei na Paraíba decidido a adotar outro modo de vida.
Já prezava essa tendência à vida frugal, meio primitiva, herança talvez dos meus ancestrais, mas o filme foi o empurrão que faltava, digamos assim, para eu ver que o homem, que já não se relacionava bem com o semelhante, passou a ignorar também os sinais da natureza, perdendo a capacidade de dialogar e de com ela conviver harmoniosamente.
Para minha sorte, ainda no final dos anos 1960, pude compreender que o pensamento político seria incapaz de formular uma política de civilização e de humanidade - e que a transformação deveria ser desenvolvida no interior de cada indivíduo, na modificação irremediável das mentalidades.
Sem demagogia, posso dizer que, se cheguei até aqui, dormindo bem e sem nunca ter recorrido aos maus hábitos ou à chamada "química externa" para suportar as dores do mundo e o inferno dos outros, longe das marchas e contramarchas da política partidária, devo o milagre, em larga medida, a Dersu Uzala.
Só espero que não tenha o trágico fim do meu guru, nas andanças a pé e de ônibus pelas ruas de João Pessoa...