Caminho pelas ruas de João Pessoa como um índio na Avenida Paulista. Esse é o mal dos nascidos e criados na cidade. Qualquer mudança, alguma fachada em ruínas, um contemporâneo que morre, um galho de árvore que tomba, tudo nos diz respeito. Outro dia, fiquei de baixo astral ao acompanhar a derrubada de uma caramboleira, em Tambiá. Ela fora a sombra gostosa do encontro com a primeira namorada. A velha casa transformada em clínica e a caramboleira retirada para dar lugar ao estacionamento. Perdi o dia.
Esvaziado, sem voz e sem voto, sem poder
A João Pessoa de hoje é assim: asfalto, cobrindo as pedras portuguesas de tantas caminhadas e os trilhos dos passeios de bonde nas tardes de domingo; o esguio poste ornamental de ferro, substituído pelo monstrengo de concreto que toma a calçada; o arranha-céu modernoso que se ergue no lugar do casarão dos amigos; as janelas apodrecidas e sempre fechadas das varandas que testemunharam flertes em dia de festa; a cidade-verde da propaganda oficial sem o mínimo apreço pelas suas árvores, rios, mangues, praias e lagoas; calçadas que não permitem a caminhada sem tombos; barulho de enlouquecer e a crescente privatização do passeio público.
Danado é que a crônica da destruição se dá em nome da modernidade... Modernidade jurássica, cujo motor é a satânica trindade "pobreza, ignorância e corrupção" - essa trindade satânica que acaba com cidades e homens.