Caminho pelas ruas de João Pessoa como um índio na Avenida Paulista. Esse é o mal dos nascidos e criados na cidade. Qualquer mudança, al...

Satânica trindade

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Caminho pelas ruas de João Pessoa como um índio na Avenida Paulista. Esse é o mal dos nascidos e criados na cidade. Qualquer mudança, alguma fachada em ruínas, um contemporâneo que morre, um galho de árvore que tomba, tudo nos diz respeito. Outro dia, fiquei de baixo astral ao acompanhar a derrubada de uma caramboleira, em Tambiá. Ela fora a sombra gostosa do encontro com a primeira namorada. A velha casa transformada em clínica e a caramboleira retirada para dar lugar ao estacionamento. Perdi o dia.

Por que uma cidade bela e agradável se deteriorou, em pouquíssimas décadas, da forma como João Pessoa se deteriorou? Penso que ocorreu com a principal metrópole paraibana o mesmo que ocorreu com todas as capitais brasileiras. A “inchação” criou vasta periferia, sem infraestrutura, mas muito povoada. Em pouco tempo, a periferia passou a ter mais importância política: elege e derrota quem quer. Como o grosso do eleitorado mora na periferia, as autoridades, por várias décadas, viraram as costas ao núcleo original da cidade.

Esvaziado, sem voz e sem voto, sem poder
político para nada, o centro pessoense foi sendo passado para trás. Como diz a cronista Clotilde Tavares, “é difícil devolver ao centro da cidade a sua alma, o seu clima, a sua atmosfera, o seu charme...”. Não é exagero dizer que João Pessoa foi agradável até 1964. Depois vieram os conjuntos habitacionais e as favelas. Com os conjuntos e as favelas, surgiu outra cidade.

A João Pessoa de hoje é assim: asfalto, cobrindo as pedras portuguesas de tantas caminhadas e os trilhos dos passeios de bonde nas tardes de domingo; o esguio poste ornamental de ferro, substituído pelo monstrengo de concreto que toma a calçada; o arranha-céu modernoso que se ergue no lugar do casarão dos amigos; as janelas apodrecidas e sempre fechadas das varandas que testemunharam flertes em dia de festa; a cidade-verde da propaganda oficial sem o mínimo apreço pelas suas árvores, rios, mangues, praias e lagoas; calçadas que não permitem a caminhada sem tombos; barulho de enlouquecer e a crescente privatização do passeio público.

Danado é que a crônica da destruição se dá em nome da modernidade... Modernidade jurássica, cujo motor é a satânica trindade "pobreza, ignorância e corrupção" - essa trindade satânica que acaba com cidades e homens.

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  1. Infelizmente, somos testemunhas desta situação. Posso dizer que vivi e desfrutei de minha terra. Saí por sobrevivência. Não a esquecerei por amor. O descaso da maioria dos seus filhos, levaram e continuará levando esta bela cidade ao pó. Nunca é demais, nunca se torna cansativo denunciarmos, mesmo por um simples comunicado como este, os crimes que os políticos cometem contra o povo deste Estado. Naturalmente, eles se sentem a salvos, protegidos pela impunidade. Pobre povo, sempre enganados, ou coniventes ?

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  2. Petronio, o centro de João Pessoa sofre a história natural do desenvolvimento urbano. Recorde-se que a Balaustrada, na Av. Trincheiras, é testemunha doente do que foi a mais elegante zona habitacional da cidade. O mesmo aconteceu com a Av. João Machado, a Maximiniano Figueiredo, e outras mais.
    Acho que tudo isso poderia acontecer sem o abandono que você testemunhou aqui acima, e que me causa muita tristeza. Não sei se ainda é possível salvar o Centro
    Eu não vou mais ao Centro, de onde só retorno chateado e deprimido. Da minha geração só Silvino e Quinca Brito lá frequentam.

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    1. Petrônio Souto21/12/21 21:39

      Estou de acordo com a médica e escritora Clotilde Tavares, irmã de Bráulio: “É difícil devolver ao centro da cidade a sua alma, o seu clima, a sua atmosfera, o seu charme...”. Sorte tivemos nós que pudemos curtir o “coração da cidade”. Um abraço, Zé Mário.

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  3. Já não há, mais, Poder Público. Tudo privatizado.

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  4. Esta manifestação de nosso amigo Petrônio, fez-me imaginar voltando a percorrer os caminhos da antiga João Pessoa, que nos são apontados com tanto sentimento pelo poeta Jomar Souto, em seu "Itinerário Lírico da Cidade de João Pessoa".
    Nesta visão nostálgica, a velha caramboleira assume a sorte da "velha gameleira/ do bairrozinho antigo/ tombaste. ontem, à noite"...como bem dizia o poeta, talvez já antevendo os males que atingiriam.
    Já quase não se vê "as flores de ipê, flor de manga,/ ou cajú ou flamboyant/ verde verde verde grama/ mais o orvalho da manhã...".
    É isto, a cidade correu para o mar e esqueceu suas origens.
    Só nos resta lamentar o abandono a que esses caminhos foram condenados.

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