Abençoados os que se aconchegam no desencanto
(a relva sob a bruma é mais úmida)
Abençoados os de paixão ardente
(o labirinto é a única certeza de um abrigo)
Abençoados os que relembram e sorriem
(a possibilidade de atalhos é um fluir da memória)
Abençoados os ausentes
(a distância é um consentimento à perfeição)
Abençoados os que se perdem no desmedido
(o que cabe não transborda)
Abençoados os que carecem das unhas
(o arrepio é uma dádiva no desespero)
Abençoados os que se dispersam
(rastros de dissolvem na insistência)
Abençoados os que rangem os dentes
(o liso não diz nada do tempo)
Abençoados os que romperam o lacre do absurdo
(No máximo uma surpresa, e uma ou outra certeza)
Abençoados os que contemplam as rachaduras na morte
(o que trepida é vida)
Abençoados os que se despem antes de calar-se
(a despedida tem seu lugar na eternidade)
(poema inédito)
- É necessário não prescindir da loucura.
Ser, quem sabe, um contrapeso à tensão da corda.
Quem estabelece o limite,
além de nós mesmos?
Se o absoluto sentido
foi encomendado nas véspera da chegada do Verbo,
passou batido por minhas mãos
e espalhou-se ruidoso pelos cantos do mundo.
- Certa é a incerteza.
É a dúvida uma potência guardada a sete chaves.
E o que se pede é a aniquilação do momento,
da pungência do instante,
do renascimento à cada aurora.
- Resta um agora
diluído em cada desejo.
Nada basta
aos nômades
nas areias das praias.
(estão sempre paranóicos
com a perseguição do crepúsculo dominical)
Alguns,
querem ser criança
para picotar os limites.
Outros,
urgem pelo calabouço.
Uns, tinham o silêncio
como adorno –
sinal de impossibilidade de aproximação.
Já os outros,
desmentiam tudo,
inclusive a malícia da boca cerrada.
As têmporas fervilham
na iminência do instante.
Todo calor disperso,
coagulou, condensou,
no que se costuma chamar alma.
(Um ar quente, com sua paradoxal leveza,
pairava impenetrável aos bons pensamentos.)
Nos dias quentes
certas idéias são indissolúveis...
Olhos extraviados não ardem
no lugar comum em que me perco...
Falei da irrelevância relativa da existência.
Aqueceram-se do calafrio com velas.
(As sombras, somadas,
ocuparam todo lugar no espelho).
Custou-me entender
que não se deve revirar prateleiras alheias,
desmantelar espaços,
desarranjar a ordem estabelecida para a vida.
Mas também, que besteira!...
Não se compartilha o fundilho rasgado
para morder o rabo!