Nunca mais vi Nadege. Nome pouco comum, não? Pois a conheci, há tempo; morava no final da Rua da República. Foi ela a responsável pela ave...

Ocaso ou o caso

cronica nostalgia escrever poemas
Nunca mais vi Nadege. Nome pouco comum, não? Pois a conheci, há tempo; morava no final da Rua da República. Foi ela a responsável pela aventura, digamos oficial ou oficiosa, da erupção de meu primeiro poema.

Erupção mesmo, posto haver um vácuo profundo, uma cratera de criatividade que nunca explorara. Somente lia os augustos anjos versejadores, dentro do paraíso ou parnaso literário dos livros didáticos.

O “EU” tomei emprestado na biblioteca do Liceu para conseguir a nota de português. Mexi com a caixa de marimbondos e experimentei voarem enxames de abelhas desconhecidas:
era a linguagem sorumbática, misteriosa, sepulcral, cientificista agasalhada em incríveis poemas do genial paraibano Augusto Rodrigues Carvalho dos Anjos.

E escapei, ao entregar a apreciação desafiadora. Puxei um oito e meio. Pois bem: versejar ou poetar era incrível para mim. Nadege me pegou de surpresa. Era o caminho habitual do franzino aluno que espreitavam para apanhar no anzol. Sei que a família dela tinha aproximação de meus pais.

A vítima (este escrevinhador) se viu com um caderno florido, em capa dura, colocado às mãos, quando, numa tarde comum, pisava a calçada da referida moça. Houve o tempo dos álbuns de confidência.

Os jovens de hoje nem sabem disso. Nadege, muito simpática, me entregou o volume fatal e me pediu para responder as perguntas de praxe, repetitivas: espécie de raio x escrito da personalidade do questionado. O questionário era extenso e variado. Nome (opcional, podendo ser substituído por um fictício) e indagações sobre amor, tipo de esporte, gostos, etc. Um pesadelo.

E, por coroamento, escrever um poema, mesmo sem qualquer tipo de vocação para tal. Repeli, no começo, mas a insistência me varreu a timidez. Levei o tal caderno para casa. Entre uma lição e outra, para cumprir o prazo instituído pela proprietária do álbum, respondia, cuidadosamente, cada quesito. Gastei duas semanas bem contadas.

Desincumbi-me daquele dever. Poema amoroso, mesmo que a musa fosse imaginada, diríamos um platônico gesto literário caberia bem. Foi quando, à tardinha, saí a ver o pôr do sol do rio Sanhauá.

Corri para casa e escrevi um soneto sobre o entardecer. Título: OCASO. Devolvi o álbum de confidências. Ela foi em cima do poema. Leu alto o título: O CASO (a caligrafia resvalada não deixou a palavra única). Nadege me cumprimentou com alegria. Encabulei-me de fazer a correção. OCASO ou O CASO, a tarefa fora cumprida.

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  1. Salvas meu caro José Leite Guerra!!
    Missão cumprida!!parabéns👏👏
    Paulo Roberto Rocha

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