Na Paraíba tudo chega atrasado, tudo demora. Enquanto nos outros lugares já estão com as castanhas assadas, aqui ainda estamos tirando o caju com a vara. Mas antes tarde do que nunca. Tem sido assim sempre – ou quase sempre. É o que eu chamo de uma irresistível vocação para o atraso – e para o muro baixo. Alguns dizem que foi praga deixada por antigos magoados da província. Não duvido. Essas coisas existem, pode crer. E quando se junta a praga com a vocação, aí é demais, não tem quem possa. Sai debaixo.
Assim foi com o chamado Museu da Cidade, que só não tem, como seria normal, o nome de João Pessoa, por razões perfeitamente conhecidas. Como sabemos, aqui vive-se ainda em 1930, em muitos e muitos aspectos, e os noventa anos passados daqueles idos distantes não são nada diante da rigidez de espíritos que não se renovam e insistem em não se renovar. Coisas de aldeia? Certamente. Mas que fazer?
Volto ao museu. Depois de mais de trinta anos de projetado, finalmente no próximo dia 4 de novembro o dito espaço histórico-cultural será entregue aos pessoenses e paraibanos, como se fosse o pagamento retardado e sem juros de uma dívida que já se julgava perdida. E para esse injustificável atraso existem várias razões. Primeiro e antes de tudo, a eterna falta de visão e de interesse dos gestores públicos para as coisas da cultura. E aqui, por dever de justiça, abre-se uma exceção mais ou menos recente para o intelectual Tarcísio Burity, em cujos dois governos muito se investiu na área cultural. Depois, a também eterna tacanhice dos tais gestores, que não quiseram assumir os custos irrisórios da recuperação da antiga casa da Praça da Independência, optando por ficar à espera de recursos do Ministério da Cultura, que nunca vieram. E nisso se passaram mais de trinta anos, veja só. Sem falar, é claro, nos entraves e na pura e simples má vontade oriundos de antigos rancores políticos sobreviventes de 1930, os quais inacreditavelmente ainda resistem, rançosos, em pleno século XXI. Coisas de aldeia? Certamente. Mas que fazer?
O fato é que finalmente o museu está aí, para fruição dos nativos e dos turistas, como mais um local a ser visitado em nossa Capital, terceira cidade fundada como tal no Brasil. Lá poderão ser vistos e apreciados objetos, informações, documentos e móveis referentes à cidade e ao político que lhe empresta o nome, a exemplo da mesa da antiga Confeitaria Glória, do Recife, onde foi assassinado o ex-presidente paraibano, em 26 de julho de 1930. Provavelmente, o museu conterá menos do que se esperaria, porque, como se sabe, muita coisa importante se perdeu nesses últimos noventa anos de desleixo, como sói acontecer entre nós, a exemplo de inúmeras peças histórico-decorativas do Palácio da Redenção, simplesmente surrupiadas, segundo dizem, para integrar acervos particulares de antigos ocupantes daquele prédio público. Coisas de aldeia? Certamente. Mas que fazer?
Mas um museu é sempre um museu, e como tal deve ser festejado. Nosso Museu da Cidade deve, por isso, ser recebido com júbilo e, se possível, com banda de música (coisa bem aldeã e bem do gosto de muitos). Afinal, mesmo que tardiamente, é mais uma conquista de nossa história e de nossa cultura, riqueza única de que dispomos, à falta de outras mais palpáveis e reconhecidas. Além de nós, paraibanos em geral, estão de parabéns o governador e o secretário da Cultura, responsáveis maiores por essa vitória.
Que o museu seja da cidade, do Estado, do Brasil, dos pessoenses e dos paraibanos, do litoral ao sertão, sem distinções de nenhum tipo. Que as gerações mais novas — e as futuras – saibam acolhê-lo de espírito aberto e arejado, e saibam principalmente preservá-lo, como patrimônio de todos que é.
A aldeia cresceu. Cresçamos com ela.