Sobre o Grupo Sanhauá
Se me questionassem a que se propunha o Grupo Sanhauá, eu responderia: apenas sintonizar a produção poética da província com a do sudeste do país, o que já consistia numa tomada de consciência – expressão tão cara à época – de que a poesia de então, geralmente edulcorada, cheia de efusões sentimentais, deveria ser combatida através de um discurso antirretórico.
Creio que não pensamos em um conteúdo programático a cumprir, pois a nossa poesia era muito mais fruto da prática do que da teoria. Ou seja, nos abeberávamos muito mais das fontes perenes da poesia do que da teoria literária em suas fontes. Afora Marcus Vinícius, de longe o mais equipado teoricamente entre nós todos, espécie de Mário de Andrade do Grupo, não sabíamos “dar nome aos bois”, conforme atesta o depoimento que prestei no III Encontro de Ecdótica e Crítica Genética, no ano de 1993, na Universidade Federal da Paraíba:
“(...) ‘Poema’, inserto em ‘A Ilha na ostra’ (Edições Sanhauá, João Pessoa, PB, 1970), porquanto se mostre um texto metalinguístico por natureza, não me ocorreu à época qualificá-lo como tal. E isso por um simples desconhecimento de causa, por não saber ainda ‘dar nome aos bois’... O que não me impediu de problematizar o discurso poético, de questioná-lo, para, aos poucos, firmar uma concepção de poesia mais afeita às experimentações líricas que se verificavam em meados da década de 1960, do que a um tipo de expressão atrelada a um passadismo inócuo e estéril. ‘Poema’ pôs em confronto esses dois tipos de discursos, ao tempo em que tomou partido por uma dicção lírica somente comprometida com a emoção, na medida em que fosse fruto de um labor constante e consciente.”1
“(...) o meu poema
poderia ser azul
como outras lâminas
mas isto me cansa
e esqueço o lirismo
de poder dizer
que do azul da lâmina
saíram gaivotas,
verão e istmos”. 2
Pois bem: éramos demasiadamente jovens, não queríamos perder tempo em questionar a poesia a não ser dentro do poema, com exceção de Marcus Vinícius, que também a questionava através de textos teóricos, didáticos, publicando-os na imprensa local e na revista “Couro” (Edições Sanhauá, João Pessoa, 1967) – porta-voz do Grupo –, em que comparece com o ensaio “problemática e necessidade da poesia de vanguarda”, grafado em minúsculo.
Da revista “Couro”, da qual saiu um só número, vale a pena transcrever o editorial – vazado em forma de manifesto – redigido por Marcos dos Anjos:
“pronto, aqui estamos: um bando de jovens que pensa em arte e cultura, que não tem o comodismo dos escreventes oficiais muitas vezes subvencionados. o grupo sanhauá, coeso e coerente, pouco a pouco se fez presença na poesia, contos, crítica, ensaios, cinema, teatro, artes plásticas, etc., sem auxílios de governos, instituições e pessoas: só o mérito e a capacidade de cada um. ontem e hoje as edições sanhauá. hoje, amanhã e depois, as edições sanhauá e couro.
couro: nosso informativo, nossa visão.
couro: província da paraíba, jovem isenta dos pecados capitais de nossos antepassados.
couro: jovens que acreditam na suficiência do braço e na eficiência do olho.
os meios de comunicações normais estão viciados. uma gang, medíocre, domina o rádio. outra, não menos, o jornal e a televisão. as grandes revistas representam interesses de sólidos grupos econômicos responsáveis pela bestialização das massas consumidoras de notícias e culturas. e daí por diante.
não temos uma linha comum de pensamento. diferimos um do outro como o sangue da seiva, como a imaginação do sonho. somos coerentes apenas com o mundo em que vivemos e a verdade que a cada homem pertence.
pronto, aqui estamos/ SANHAUÁ”
couro: nosso informativo, nossa visão.
couro: província da paraíba, jovem isenta dos pecados capitais de nossos antepassados.
couro: jovens que acreditam na suficiência do braço e na eficiência do olho.
os meios de comunicações normais estão viciados. uma gang, medíocre, domina o rádio. outra, não menos, o jornal e a televisão. as grandes revistas representam interesses de sólidos grupos econômicos responsáveis pela bestialização das massas consumidoras de notícias e culturas. e daí por diante.
não temos uma linha comum de pensamento. diferimos um do outro como o sangue da seiva, como a imaginação do sonho. somos coerentes apenas com o mundo em que vivemos e a verdade que a cada homem pertence.
pronto, aqui estamos/ SANHAUÁ”
O editorial denota mais uma preocupação de ordem social do que estética, o que não quer dizer que esta última não fosse também objeto de nossas reflexões. É que vivíamos em plena vigência da ditadura militar, e com um discurso panfletário, tribunício, acreditávamos esbofetear o rosto do tempo. Ou seja, não desejávamos incorrer em um dos equívocos de 22, que consistiu, segundo Mário de Andrade, em virar as costas às convulsões políticas e sociais que afligiam o Brasil de então.
O editorial da revista faz menção ao fato do Sanhauá, mesmo sem “o auxílio de governos, instituições e pessoas”, investir na poesia, na ficção, na dramaturgia, enfim, em todas as artes de um modo geral. Aliás, a esse propósito, escrevi o seguinte no meu discurso de posse na Academia Paraibana de Letras:
“(...) Marcos dos Anjos, além de artífice, exercia a função de um verdadeiro mecenas, responsável não só pelas edições do Grupo Sanhauá, como também pelo patrocínio generoso de muitas das noitadas etílicas na Bambu e no Cabaré de Berta. Foi uma espécie de Ênio Silveira da década de 1960, início da de 1970, no contexto cultural da província”. E acrescentava: “Não transitamos nos corredores oficiais da época e tampouco vivemos à cata de prefácios dos monstros sagrados de então. Soubemos delimitar o nosso espaço. E o que ocupávamos mantinha uma estreita relação com o espaço marginal do sapo cururu bandeiriano: “(...) Longe dessa grita,/ Lá onde mais densa/ A noite infinita/ Verte a sombra imensa.// Lá, fugido ao mundo,/ sem glória, sem fé, / No perau profundo/ E solitário, é/ Que soluças tu,/ transido de frio//, sapo cururu/ Da beira do rio”. Para arrematar: “Mas éramos, a um só tempo, carbonários e auto-suficientes”. 3
No prefácio à Antologia Poética Grupo Sanhauá, publicada pela Editora da Universidade Federal da Paraíba, no ano de 1979, Marcos Vinícius explicita o porquê dos nossos livros serem mimeografados, de feição artesanal, quase rudimentar:
“(...) Era (...) mais uma prova de que o que é verdadeiramente NOVO não resulta de inquietações meramente subjetivas – mas sim das soluções que se impõem a partir da realidade objetiva, de forma não-gratuita, atendendo às exigências de uma determinada circunstância histórica”.
E que exigências seriam essas? Entre muitas, a de rejeitar toda e qualquer forma de cooptação, principalmente das instituições oficiais e oficiosas, sucursais do poder discriminatório da época. Porém, deixemos que nos fale, mais uma vez, Marcos Vinícius:
“(...) O primeiro passo foi o rompimento da ‘aura’ do livro-enquanto-produto: assumimos plenamente a idéia do artesanato editorial, mimeografando os nossos poemas e publicando-os em volumes cujas capas eram de papel-de-embrulhar-carne, ilustradas com xilogravuras feitas pelo Pontes e pelo Raul. Assumimos, assim, a nossa pobreza, de forma integral, mostrando que a falta de recursos nunca iria servir como pretexto para continuarmos inéditos. Desta maneira, isentos de qualquer postura de beletristas engravatados, da mesma forma que nos empenhávamos na produção da poesia, lançávamo-nos também na execução das tarefas mais rudimentares: rodar os ‘stencils’, cortar os papéis nas oficinas d’’A União’, colar uma por uma as capas dos livrecos (capas que o Teone imprimia gratuitamente) e até ajudar na preparação do ‘sangue de carcará’ – cachaça com Q-suco de morango (argh!) – que seria servido aos convidados para os lançamentos, na casa de nosso Pedro Santos, que sempre foi o mentor espiritual do Grupo”.
A par da atividade literária, desfrutávamos do merecido ócio propiciado pela boemia, em que a Bambu era uma espécie de centro de convergência e de divergências de toda uma geração. Geração de amotinados/ num barril de amontillado/ levantando barricadas/ nas doses de rum e de gim/ e em copas se fechando/ às baionetas caladas,/ aos eloquentes clarins.
As décadas de 60 e de 70, aqui na Paraíba, e em todos os quadrantes do Brasil e do mundo, foram marcadas por um arraigado sentimento grupal. Em João Pessoa, proliferavam grupos de artes plásticas, de teatro, de literatura etc, todos assíduos frequentadores da Bambu, onde as discussões, apesar de acaloradas, dificilmente resvalavam para o desforço físico, pessoal. As ideias é que se digladiavam, é que pugnavam, com argumentos cada vez mais belicosos, mais beligerantes. E tais discussões, quase sempre, eram provocadas pelo crítico e ficcionista Virginius da Gama e Melo, que, atiçando, açulando, instigando, punha uns contra os outros, para, por trás das grossas lentes dos óculos, e disfarçando um sorrisinho maroto, acompanhar as contendas como um inocente e impassível espectador. Virgínius, este enormíssimo Cronópio, ainda continua uma personagem em busca de um autor, sobretudo pelo seu lado boêmio, pelos seus tiques, cacoetes, pelo seu humanismo, pela sua voz metálica, de araponga: martelo a repicar na bigorna da garganta.
Não se pense, porém, que Virgínius semeava a discórdia e a maledicência entre os jovens que o rodeavam nas mesas da Bambu. O que ele queria, simplesmente, era agitar a vida cultural da província, suscitar polêmicas, réplicas, tréplicas, através dos jornais. Evitar, em suma, que a João Pessoa de então mergulhasse no profundo estado de letargia em que vivia imersa num passado quase recente. E fomentar ainda mais a efervescência da província, que vivia a pleno vapor a revolução cultural dos anos 60. Daí, num tom provocativo, bem ao seu feitio, denominar o Grupo Sanhauá de a “marcaria” (pela abundância de Marcos que o integravam). Ou matricular, em um Curso de Português, ministrado na antiga FAFI (Faculdade de Filosofia), os integrantes da recém-fundada UPE (União Paraibana de Escritores), entidade que fazia oposição à UBE (União Brasileira de Escritores), a qual ele pertencia, quando, num deslize gramatical, escrevemos: “Nós, da UPE, viemos...”, logo no início do manifesto que havíamos tornado público nas páginas do jornal “O Norte”.
Apesar das refregas, o ambiente era da mais pura camaradagem. Tanto que, para apresentar o meu livro de estreia, “Gestos lúcidos” (Edições Sanhauá, João Pessoa, 1967), convidei o poeta Vanildo de Brito, da Geração 59. O que ele o fez, apenas com uma ressalva: “Pária, não dava para ter escolhido outro título? ” Nem deu para indagar a razão, pois, imediatamente, ele ajuntou: “Antes do lançamento, vamos para o Bar do Chapéu, não vamos? Pois bem: e após algumas talagadas de aguardente, você não acha que este título é impronunciável?” Era assim o boêmio Vanildo de Brito das décadas de 60 e 70, antes de, por determinação médica, abandonar o álcool e tornar-se o abstêmio que foi até o fim da vida. Ainda hoje, soa aos meus ouvidos o indefectível “pária”, forma carinhosa de tratamento com que se dirigia aos amigos. Saudades!
Vanildo foi o mentor e artífice da Geração 59, sobre a qual teci algumas considerações no prefácio do livro “Iluminuras” – ainda inédito –, de Jurandy Moura:
“Muito já se falou de que a Geração 59 seria uma ressonância do Modernismo de 22, embora aqui, na Paraíba, tal movimento não tenha dado sequer o ar de sua graça, exceção feita a alguns manifestos publicados na revista ‘Era Nova’, e a alguns poemas timidamente modernistas de Perylo Doliveira e Eudes Barros. No mais, tudo continuou como dantes no quartel de Abrantes, pois até mesmo quem se propunha divulgar a nova estética no Nordeste, o pernambucano Joaquim Inojosa, o fez em palestras e artigos vazados dentro dos moldes estritamente parnasianos, num comportamento típico de quem ouviu o galo cantar sem saber exatamente onde.
Pelo menos em parte, os da Geração 59 corroboraram o ideário estético da Geração de 45, principalmente quando erigiram o soneto à condição de carro-chefe do movimento, conforme ratifica a coletânea que reúne os poetas dessa geração.
Há quem diga que os núcleos temáticos de 59 retomam os de 45: o Silêncio, a Noite, o Sonho, o Transcendental... Acontece, porém, que esses temas são uma constante na poesia de todos os tempos e lugares, circunstância que não autoriza ninguém a considerar essa Geração um eco retardatário da de 45. Fosse assim, o Grupo Sanhauá, aqui na Paraíba, também o seria do Concretismo e seus desdobramentos, valendo ressaltar que “Alguns Gestos” (1963), livro com o qual Marcos dos Anjos assenta as bases do Grupo, ainda não formaliza de todo um compromisso efetivo com a poesia de vanguarda, mas, antes, um forte vínculo com uma poética de extração social e lírica, esta última calcada numa dicção agonicamente existencial, diferente do timbre asséptico, sem a marca “suja da vida”, das experimentações poéticas dos irmãos Campos e Décio Pignatari.
O fato é que, numa província em que grassava uma poesia piegas, edulcorada, conservando ecos do parnaso-simbolismo, 59 e Sanhauá, cada qual ao seu modo – e no contexto de suas respectivas épocas –, representaram um franco e consistente percurso ascensional da poesia paraibana. A primeira, através da reação; e Sanhauá, surgindo quatro anos depois de instaurado o movimento cujo principal líder foi Vanildo de Brito, consolidando a ruptura com a poesia então vigente, inclusive com a da Geração 59”.
Pelo menos em parte, os da Geração 59 corroboraram o ideário estético da Geração de 45, principalmente quando erigiram o soneto à condição de carro-chefe do movimento, conforme ratifica a coletânea que reúne os poetas dessa geração.
Há quem diga que os núcleos temáticos de 59 retomam os de 45: o Silêncio, a Noite, o Sonho, o Transcendental... Acontece, porém, que esses temas são uma constante na poesia de todos os tempos e lugares, circunstância que não autoriza ninguém a considerar essa Geração um eco retardatário da de 45. Fosse assim, o Grupo Sanhauá, aqui na Paraíba, também o seria do Concretismo e seus desdobramentos, valendo ressaltar que “Alguns Gestos” (1963), livro com o qual Marcos dos Anjos assenta as bases do Grupo, ainda não formaliza de todo um compromisso efetivo com a poesia de vanguarda, mas, antes, um forte vínculo com uma poética de extração social e lírica, esta última calcada numa dicção agonicamente existencial, diferente do timbre asséptico, sem a marca “suja da vida”, das experimentações poéticas dos irmãos Campos e Décio Pignatari.
O fato é que, numa província em que grassava uma poesia piegas, edulcorada, conservando ecos do parnaso-simbolismo, 59 e Sanhauá, cada qual ao seu modo – e no contexto de suas respectivas épocas –, representaram um franco e consistente percurso ascensional da poesia paraibana. A primeira, através da reação; e Sanhauá, surgindo quatro anos depois de instaurado o movimento cujo principal líder foi Vanildo de Brito, consolidando a ruptura com a poesia então vigente, inclusive com a da Geração 59”.
Apesar das baionetas caladas e dos eloquentes clarins, éramos afeitos ao diálogo. Diálogo com os amigos e com as vozes dos poemas, que um poema se inicia quando outro é dado como concluído, pois, ao final e ao cabo, todo poema é uma caixa de ressonância de outros poemas. Foi assim com Marcos Tavares e Márcio Sampaio, quando o primeiro, num procedimento intertextual, retoma um poema deste último, para, ao seu modo, dilatar a sua arte poética e a sua visão do mundo. Vejamos o poema “Palavra” (1965), de Márcio Sampaio:
todo mundo fala as mesmas palavras
eu não sei falar todas as palavras
nem sequer sei falar algumas palavras
mas elas estão dentro de mim como água
prestes a se despejar sobre o encanto de um sofrimento.
eu não sei se as minhas palavras voarão
nem sequer sei se elas são pássaros
ou triste granada no campo inimigo
mas elas estarão um dia junto ao mundo
e transformarão alguma coisa em nada.
é por isso que o meu poema vem num corcel vermelho
entregando espadas de fogo aos tristes dias
é por isso que a dor desta entrega é SANGUE
com que se escreve a palavra: MORTE4
E “natureza morta com casa” (1976), de Marcos Tavares:
não sei
se minhas palavras voarão;
não sei sequer se terão asa.
mas elas estão dentro de mim
como uma casa dentro de outra casa.
não sei
se minhas palavras voarão,
não sei sequer se serão fala.
mas, se conversamos
é uma pena.
outras palavras
de outros poemas,
vagam dispersas pela sala.
O poema de Marcos Tavares, logo nos primeiros versos, revela a desconfiança de que jamais venha a possuir autonomia de vôo, diretrizes próprias, auto-suficientes: “não sei/ se minhas palavras voarão; não sei sequer se terão asa...”.
Já os versos “mas elas (as palavras) estão dentro de mim/ como uma casa dentro de outra casa”, começam por explicitar o procedimento intertextual de Marcos Tavares com relação a Márcio Sampaio. Parecem sugerir que as palavras, à feição de uma casa preexistente, passam a ser inquilinas de outra casa. Enfim, um poema-casa dentro de outro poema-casa, numa espécie de construção em abismo.
A segunda estrofe – “não sei/ se minhas palavras voarão,/ não sei sequer se serão fala” –, apenas reitera a primeira. Só que, desta feita, o verso “não sei sequer se serão fala”, além de demonstrar o receio de não diferençar a voz do eu lírico das muitas com as quais dialoga, sobretudo com as do poema de Márcio Sampaio, revela a desconfiança de que a sua dicção lírica, na impossibilidade de atingir a individualidade da fala, permaneça nos estreitos limites da língua.
Na estrofe que conclui “natureza morta com casa” – “mas, se conversamos/ é uma pena./ outras palavras/ de outros poemas,/ vagam dispersas pela sala” –, tudo faz crer que o eu lírico dirige-se ao leitor, a quem lamenta o fato de, no diálogo estabelecido entre ambos, ressoarem palavras de outros poemas. Mas as palavras, longe de serem intrusas, são convocadas, instadas, recolhidas, para compor esse poema no qual o eu lírico demonstra o quanto a criação literária, antes de ser uma “guerra sem testemunhas”, como queria Osman Lins, consiste numa guerra, numa batalha campal, em que o poeta dispõe de testemunhas que são, a um só tempo, aliados: os outros poetas. No caso de Marcos Tavares, Márcio Sampaio, do qual aproveita, com ligeiras modificações, os seguintes versos: “todo mundo fala as mesmas palavras/ eu não sei falar todas as palavras/ nem sequer sei falar algumas palavras/ mas elas estão dentro de mim como água/ (...) // eu não sei se as minhas palavras voarão/ nem sequer se elas são pássaros”. Versos que também são um reconhecimento formal de que o ato de escrever implica um diálogo entre tudo e entre todos: “todo mundo fala as mesmas palavras”. Em suma, são dois poemas de nítida concepção intertextual e metalinguística, poiquase sempre, intertextualidade e metalinguagem andam juntas, de mãos dadas, faces que são de uma mesma moeda.
A par das influências episódicas, ocasionais, outra se insurgia forte, quase permanente: a de João Cabral de Melo Neto. Para usar de um neologismo do poeta Murilo Mendes, no poema “Texto de informação”, do livro “Convergência”: “Joãocabralizei-me”5. Não só eu, mas quase todos que compunham o Grupo Sanhauá, principalmente Marcos Tavares e Marcos Vinícius, embora nesse último fosse também visível a apropriação dos postulados da Instauração Práxis – movimento liderado por Mário Chamie –, a exemplo da primazia que ele confere às paranomásias, às aliterações, em detrimento das metáforas, procedimento típico das vanguardas dos anos 50 e 60:
a) o sino, o silêncio
o dão e o dim
repicam missa à messe:
moça acorda/corre
mulher acorre
correm véus (voo)
e vida.
e lida – luta – luto
e tudo e tanto:
clerical e claustro
a custo a missa.
b) pão e vinho – vão e pinho
cristo na cruz acre e cru
cruzado corpo, corpocruz
- luz?
tilintam os tlins, o tilintar:
fim.
c) missa acaba e volta a messe
a cruz, os braços cruzados.
Poema missa, Antologia Poética Grupo Sanhauá, Editora Universitária/UFPB, João Pessoa, 1979)
Já Marcos dos Anjos e Anco Márcio eram bem menos cabralinos, apesar da poesia substantiva e anti-retórica do primeiro possuir algumas ressonâncias de “O Cão sem plumas”6, principalmente no que tange à utilização das anáforas. Senão, vejamos alguns versos iniciais do poema de João Cabral de Melo Neto:
“(...) Sabia dos caranguejos
de lodo e ferrugem.
Sabia da lama
como de uma mucosa.
Devia saber dos polvos.
Sabia seguramente
da mulher febril que habita as ostras.
(...) Abre-se em flores
pobres e negras
como negros.
Abre-se numa flora
suja e mais mendiga
como são os mendigos negros.
Abre-se em mangues
de folhas duras e crespas
como um negro.
E também alguns versos de “outros gestos de existir-se”, do livro “alguns gestos”, Edições Sanhauá, João Pessoa, 1963, de Marcos dos Anjos:
“o homem no pranto
o homem no canto
o homem no amor
]
o homem na terra
- a terra do homem
o homem no homem
escravo do homem
o pranto na terra
- é o canto do homem
o olha na terra
- é o amor do homem
a terra é o homem
- sua liberdade
- seu pranto
- seu canto
- seu amor”
“se fosse esse rio
se fosse essa rua
se fosse essa casa
é simplesmente um homem
que é também viaduto
em si fluem cidades
condensam-se postes
reflete-lhe os bondes
espia-lhe os anúncios
nu e risonho
é simplesmente um homem
sozinho na ponte”
“outros gestos de existir-se”, poema de “alguns gestos”, edições sanhauá, João Pessoa, 1963)
O segundo, na esteira de Geir Campos e de Thiago de Mello, cultivava um discurso tribunício _ à época, dizia-se participante, engajado –, cujo livro, “Canto-chão”, Edições Sanhauá, João Pessoa, 1963, tão bem o exemplifica:
“quando a terra estiver livre
meu poema será ode...
a rude mão
que a terra seca
fará do amor
seu canto de liberdade
(...) este ferro
que mil covas
cava
não fere a terra
que esperanças
encerra
não passará muito tempo
para o chão
que o homem pisa
libertar-se do cambão
e os que pisam chão-escravo
terras livres
pisarão
(...) um brado de homens
do chão se levantará
quando a terra for partida
e a semente germinar
— o homem criará raízes
no solo
que o pé pisar.
O prefácio de “Canto-chão” é de Antônio Serafim, que escreve: “(...) no entanto o engagée de sua arte não lhe serve de demérito. ao contrário, valoriza sobremaneira a sua temática conferindo-lhe um conteúdo lírico-revolucionário”. E conclui, sempre em minúsculas: “fruto de uma geração consciente de sua responsabilidade, anco márcio analisa, vê com seus olhos de artista, a cruciante situação social do nosso homem do campo. isto sem o preciosismo dos pseudo-poetas que abundam em nossos dias. poesia simples e fluente. poesia, enfim”.
Conheci a poesia de João Cabral de Melo Neto, através de Marcus Vinícius, espécie de Mário de Andrade do Grupo Sanhauá, assim como outro Marcos – de sobrenome Tavares – encarnava à perfeição o espírito polêmico e irônico de Oswald de Andrade.
Àquela época, só havia chegado a Drummond, Vinícius de Moraes e Cecília Meireles, esta última com uma dicção tão musical, tão harmoniosa, que mais parecia uma mão que balançava o berço do adolescente quase menino que eu ainda era em inícios dos anos 60.
Foi justamente naquele período que à poesia musical de Cecília Meireles se opôs a anti-lira de Cabral. E se opôs como uma pedra cuja difícil configuração estivesse a exigir um longo aprendizado. Tanto que, para apreendê-la melhor, removia-a para dentro dos meus poemas. Mas se principiava aí uma árdua “educação pela pedra”, fazia-o sem amargar a “angústia da influência” de que fala o crítico norte-americano Harold Bloom. E tinha pelo menos um motivo para tanto: se o primeiro João Cabral não se mostrou imune às influências, por que haveria eu de sê-lo, contando apenas 18 anos de idade? Estava em boa companhia, como de resto todos os da minha geração, pois quase ninguém conseguira escapar incólume à personalidade marcante do poeta pernambucano.
Quando nas mesas dos bares, Marcos Tavares terçava e esgrimia uma ironia cáustica, ferina, a par de um humor pungente e doído, mas silenciava todo esse rico manancial (ou arsenal?), travestindo-se de um antípoda dele mesmo, quando escrevia poemas cuja gravidade se opunha diametralmente ao seu temperamento:
“antônio virgulino da silva,
punhal na cintura, rifle na mão,
não compreendia o fenômeno lampião.
antônio virgulino, compreendia-se pelo intento
de situar seu bando
no espaço e tempo.
antônio virgulino, compreendia-se basto
para se avir de todo
com o magote de machos;
antônio virgulino compreendia-se capitão
perseguido pela tropa
em insubordinação.
antônio virgulino compreendido mais a fundo,
mais se isolaria
da idéia do mundo”.
Poema de abertura do livro “Dual dos Incriados”, Edições Sanhauá, João Pessoa, 1964)
Aqui, a estapafúrdia explicação sociológica do fenômeno Lampião poderia até ser cabível, justificável, caso o poema possuísse a magia, o sortilégio das “argumentações” poéticas, para torná-lo convincente, verossímil. Na falta desses apetrechos, Antônio Virgulino da Silva, o Lampião, torna-se um personagem evanescente, incriado, no plano da execução artística.
Mas em “Fuzuê e finados” (Edições Sanhauá, João Pessoa, 1963), seu livro de estreia, a graça e a festa da linguagem, o aspecto lúdico dos seus versos, conseguem estabelecer uma espécie de contraponto à gravidade temática do poema: o conflito agrário. Eis “oferenda”:
“não gesto
que o esforço cansa
só descanso
que canta e gesta.
o ir-se no adeus
que mãos informes
não contém.
o braço, unido
em abraço
e a forma
que corre e quebra
no mar e morre.
grande é a luta
e a foice que se arriba.
bom é que se gaste o sono;
que depois da noite
se domine o canto.
E o poema “fuzuê”, desse livro monotemático:
foi deste mundo
que tirou-se o canto.
deste chão
brotou-se outro canto
nesta relva
a invocação do encanto.
não se construiu
onde correu o sangue
que em luta o campo
extenua e cresce.
em irmanar
nossas mãos são preces.
Adotando a ironia e o humor como fórmula ou antídoto para combater “o gosto cabotino da tristeza e se reajustar ao mundo dos sãos”7, Manuel Bandeira, a partir de “Libertinagem” (1930), encontrou a sua identidade poética, a voz com que se diferençar das muitas vozes com as quais dialogava. Mas se, em Bandeira, o humor e a ironia foram buscados, procurados, consistindo mais numa estratégia intelectual, em Marcos Tavares, surgiram espontaneamente, frutos de uma necessidade interior, dos ditames do eu profundo. Nem por isso, porém, eles deixaram de ter eficácia no sentido de debelar a circunspecção da poesia de João Cabral nos poemas do poeta paraibano.
Marcos Tavares, enfim, encontra a seriedade na sua poesia. Mas uma seriedade que se cumpre por vias transversas, oblíquas, corroborando o que escreve Adolfo Casais Monteiro a propósito de Bandeira e Drummond:
“A poesia é mais séria do que nunca, e por isso mesmo tem de escorraçar dos seus domínios os homens ‘sérios’, compenetrados na suprema importância das tradições, das formas, do ‘metier’, das ‘verdades eternas’; é chegada a hora de reinventar a seriedade pela zombaria, a verdade pelo descrédito lançado sobre os donos da verdade” 8.
Com os versos do poema I, de “réquiem para a confederação dos tamoios” (1977), publicados na “Antologia Poética Grupo Sanhauá”, Marcos Tavares reinventa a “seriedade pela zombaria”, quando, através do discurso parodístico, contesta a série ideológica então vigente. Ou seja, pregando a desordem, a subversão, insufla o índio à vindita, a erguer lanças e tacapes – palavras, evidentemente, que se revestem de uma nítida conotação fálica –, para emprenhar as brancas do cerrado:
vai,
assim como estás,
nu.
levanta tua lança
na perimetral sul
do planalto.
sacode a clava
adormecida.
devolve a morte
que te deram
com a vida.
emprenha as brancas
do cerrado,
e escuta o brado
retumbante
dos seus ais.
No poema acima, outra apropriação intertextual: “o brado/ retumbante...”, versos extraídos da letra do Hino Nacional brasileiro, aqui utilizados em tom de chacota, destituídos, naturalmente, de qualquer sentimento de amor à pátria.
No poema XI, a voz destemperada do chamado homem branco hostiliza o índio, denominando-o de sujo e de dito cujo, transformando-o num ser reles, inominável, subserviente, “que se cala quando eu passo”. Já no início da segunda e última estrofe, embora reconheça a aculturação pelo silvícola dos hábitos e costumes do homem dito civilizado, o sujeito emissor do poema cuida de degradá-lo à condição de animal, de submetê-lo a um processo de zoomorfização, pois, só assim, julga demarcar o seu espaço, a sua diferença com relação a ele:
cuidado, índio sujo!
você é o dito cujo
que se cala quando eu passo.
que faz o que eu faço,
mas à noite
urra como onça
acordando as crianças.
Mas a par dos poemas de extração política, outros existem em que o poeta investe maciçamente no lirismo, como neste “bolero 3”:
doutor, afine esse
diapasão.
meu coração anda,
ultimamente,
num ritmo que não quero.
devolva-lhe o bolero
ou me retire do salão.
Nesses versos de Marcos Tavares, é visível a ressonância de “Pneumotórax”, de Manuel Bandeira, sobretudo da última estrofe:
“(...) — O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
— Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino”. 9
Inserto no livro “Libertinagem”, de 1930, época em que o público leitor não estava tão afeito ao estranhamento quanto o de hoje, a “prescrição” do médico ao tuberculoso — “— Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino”. – deve ter provocado um certo frisson entre os parnasianos empedernidos, de carteirinha, habituados com uma poesia regida por uma relação lógica de causa e efeito. Ora, a se levar em conta que o estranhamento consiste na quebra da expectativa do leitor, esses versos devem ter soado de forma inusitada, beirando o non-sense, àqueles que ainda só tinham ouvidos para escutar as estrelas do belíssimo poema de Bilac.
No caso de Manuel Bandeira, “tísico profissional”, como ele próprio se autodenominava, o “tocar um tango argentino” talvez correspondesse à execução da trilha sonora de “uma vida inteira que poderia ter sido e que não foi”10. E, ainda, a um aparente dar de ombros ante a irreversibilidade do mal que estava fadado a lhe consumir, restando-lhe, como alternativa, a apropriação do humor, da ironia, para neutralizar “o gosto cabotino da tristeza”. Procedimento, aliás, bastante comum entre homens que, na vida real, se viram diante de determinadas situações-limite, como foi o caso de Jacob Astor, um dos passageiros mais ricos a bordo do Titanic, quando, observando o mar cheio das lascas do iceberg contra o qual o navio havia abalroado, exclamou: “Eu tinha pedido gelo, mas isso é ridículo!”11. Frase que Freud explica:
“Significa (o humor) não apenas o triunfo do ego, mas também o do princípio do prazer, que pode aqui afirmar-se contra a crueldade das circunstâncias reais”.12
Já no poema de Marcos Tavares, o eu lírico parece assumir um comportamento nostálgico diante dos tempos idos e vividos. Tanto que o melodramático apelo “devolva-lhe o bolero/ ou me retire do salão”, soa como um ultimato ou como um pedido de eutanásia, já que o salão é a própria vida. Quem sabe, então, a azáfama dos tempos modernos, o turbilhão, o ruído ensurdecedor das ruas, não tenham imposto um ritmo indesejável a quem, antes, experimentara o dolce farniente de uma existência tão repetitiva como os passos românticos de um bolero (dois pra lá, dois pra cá)?
Ao seu modo, esse poema consiste numa espécie de canção do exílio, uma vez que a busca do locus amoenus expressa a desaclimatação do eu lírico diante de uma realidade que, existindo como um locus horrendus, e à sua revelia, obriga-o a procurar o Paraíso perdido, romântico, a Pasárgada de outras épocas.
De lá para cá, ou seja, do advento do Grupo Sanhauá aos dias de hoje, já se passaram quarenta e sete anos, pois “alguns gestos”, de Marcos dos Anjos, foi lançado em 1963.
Jovens, muito jovens, tínhamos a firme convicção, a crença inabalável, de que seríamos reedições de Homero, Dante, quem sabe de Shakespeare ou de Milton. Aos poucos, porém – e na esteira de um dos poemas de Paulo Leminski –, já nos conformávamos em reeditar João Cabral, Carlos Drummond de Andrade ou Manuel Bandeira. Até que, passado algum tempo, nos contentávamos em ser os poetas municipais que sempre fomos, embora com alguma repercussão além dos limites da província.
Com efeito, sobre o poeta, compositor e maestro Marcus Vinícius, o crítico Tárik de Sousa, não poupou elogios: “(...) De formação erudita, tecnicamente equipado como somente dois ou três autores brasileiros da chamada área popular (...) Por outro lado, hábil atonalista, ele veste a maioria dos esplêndidos arranjos de uma provocante inquietação melódica...”. Isso, enquanto a revista Veja, nos finais dos anos 70, pontificava: “Estudou (Marcus Vinícius) e a seguir ensinou música contemporânea no Instituto Villa-Lobos, em 1968, depois dirigiu a programação do museu de arte moderna. Vinícius – apesar de suas raras aparições públicas – é uma das mais vigorosas revelações da geração pós-tropicalista”. E o que escreve José Ramos Tinhorão a propósito do ex-integrante do Grupo Sanhauá?
“(...) ele é hoje um dos profissionais mais bem preparados, dentro do atual panorama da moderna música popular”.13
Marcos Tavares, ainda nos anos 70, fez por merecer – quando conquistou um dos prêmios de poesia da revista “Escrita”, de São Paulo, com o livro “Três Lições” –, as seguintes palavras do poeta e crítico Mário Chamie: “ (...) seria um tipo de artefato moldado pela melhor poesia-praxis brasileira. O autor é artesão beneficiário que percorre com competência os caminhos da vanguarda nova (...)” . A peça “Hoje a banda na sai”, de sua autoria, foi premiada pelo Instituto Nacional de Teatro.
Anco Márcio, por sua vez, dedicou-se à poesia, ao teatro, à ficção adulta e à literatura infanto-juvenil. Muitos dos seus textos de humor foram veiculados em “O Pasquim”, órgão de resistência ao regime militar de 1964. Sobre Anco, escreveu Ziraldo:
“(...) é um humorista de texto original e criativo. Este livro é apenas uma pequena amostra do seu trabalho, que talvez venha a servir para garantir sua entrada na fechada galeria de autores brasileiros”.13
Marcos Pereira dos Anjos viveu apenas 40 anos. Editou não só os livros dos poetas que integravam o Grupo Sanhauá, como os volumes “O Ataque” (teatro), de Antonio Serafim do Rego Luna, e “Linha de limites” (contos), de Emanuel Ponce de Leon Jr. Ativista cultural e poeta lançou um único livro, “alguns gestos”, com o qual assentou as bases do Grupo.
Publiquei dois livros pelo Sanhauá: “Gestos lúcidos” (1967) e “A Ilha na Ostra” (1970). Os demais foram “Domicílio em trânsito e outros poemas” (Editora Civilização Brasileira, Rio de Janeiro, 1983), “O Cerco da memória” (Editora da UFPB, João Pessoa, 1993), “A Quatro Mãos” (Editora da UFPB/ ANPOLL, João Pessoa, 1996), “Zôo imaginário” (Escrituras Editora, São Paulo, 2005) e “O Cristal dos verões” (Escrituras Editora, São Paulo, 2007). “Os Paralelos insólitos” (Editora da UFPB, João Pessoa, 1996) “Longe daqui, aqui mesmo – a poética de Mario Quintana (Editora UNISINOS, São Leopoldo, Rio Grande do Sul, 2000) e “A Casa e seus arredores” (Editora Manufatura, 2007, João Pessoa) são livros de ensaios.
Sobre a minha poesia, o crítico paranaense Temístocles Linhares, em “Diálogos sobre a Poesia Brasileira” (Editora Melhoramentos/MEC, São Paulo, 1976), escreveu:
“Não. Direi pouco sobre o Sr. Sérgio de Castro Pinto, autor de ‘A Ilha na Ostra’ (...), talvez o mais realizado dos três como poeta, o mais avançado, o mais vanguardista, capaz de dedicar a maior parte do seu livro à máquina fotográfica, chegando ao ponto de ver analogia e antagonismo entre fotógrafo de rua e avestruz (...). Esse jogo de palavras deixa os novos com água na boca, tanto dos concretos como dos homens da práxis. (...) Muito original, sem dúvida, esse poeta de João Pessoa”.
Benfazejos arroubos os da juventude, a soberba desmedida dos jovens, virtudes sem as quais teríamos nos extraviado dos caminhos sempre tortuosos e íngremes da poesia. A perseverança, hoje, talvez seja o vocábulo mais exato para substituir as efusões da juventude perdida. Perdida? Não, pois creio que, de alguma forma, ela permanece na devoção à palavra, na profissão de fé na poesia!