Sentado do alto da pequena colina pescava vazios espalhados à sua frente. Nos espaços da tela em branco, ia preenchendo com paisagens. Inicialmente, rabiscou as águas pelo terreno em movimento contínuo, uma lenta procissão com seu tom escuro, pinceladas de ouro e prata a variar o reflexos vindos do céu. Era o largo rio.
Às margens, rápidos toques deram vida a uma vegetação de características próprias, cujas raízes desciam à terra abaixo da lama e da água, conhecedora do fluxo e refluxo das marés, batizada de manguezal. Verdes variados ao longo do dia.
Mais um toque. A flora abre um claro, a água toca livremente à terra. Um pequeno atracadouro imaginário surge. Tábuas servem de base e próximo dali, sequenciadamente, pequenas canoas de pesca enfileiradas chamam a atenção. Uma ao lado da outra pintadas de amarelos, vermelhos, azuis e verdes. Uma brisa cria pequenas marolas, espana as folhas, varre os mundos.
E mais um cenário. Em terra firme, há alguns metros, surgem pequenas casinhas coladas uma às outras, sem jardins, multicoloridas. Tons alegres enfeitam as ruas estreitas, como as bandeirolas colorem os terreiros durante os festejos juninos. Bombinhas de tintas salpicadas tornam em ruelas, vielas e pequenas plantas floridos espaços de vácuos. De caminhos novos, a passagens históricas.
As ruas, em horários noturnos, ganham pontinhos amarelados dependurados, estrelinhas artificiais, fracas luzes pendem dos postes a intervalos insuficientes para fazer retornar o dia. Imitação humana de invenção divina.
Nas cercanias dali, toques do pincel criam trilhos que serpenteiam quase por entre paredes e terras elevadas. Um simpático trem, sem ser tão veloz e não tão lento, em idas e vindas, já sem soltar fumaça, espalha apitos para chamar atenção para si.
E surgem inclinações em pedras antigas a guiar todos para as partes altas. Elevações para mirantes onde se vê toda a criação abaixo e além, banhada no final do dia pelo ouro do horizonte.
Ao término, seguiu seu caminho pelos tempos e lugares. Deixou a pintura para ser vivida e preservada. Assim deve ter sido o Porto do Capim dos primeiros tempos da cidade Parahyba. Alguém esqueceu de cuidar. As paredes racharam, o rio poluído, o mangue atacado, as canoas abandonadas. O portinho sufocado foi deixado para trás. E os dias seguem.