Desde que o homem é homem, tem a ambição de fabricar instrumentos que o auxiliem e eventualmente o substituam. A história humana pode ser contada, e sobretudo compreendida, a partir dos artefatos com que ele vem transformando a natureza. A máquina é uma extensão de nossas faculdades e aptidões; quanto mais sofisticada, mais indicativa do refinamento a que terá chegado a inteligência humana.
Entre a enxada e o computador, vai um abismo que separa a nossa pré-história do estágio em que fazemos viagens fora da Terra, aspirando à conquista do espaço cósmico. O paradoxal é que, enquanto supercomputadores calculam as trajetórias que nos levam à lua, muita gente nos rincões terrenos tem que usar a enxada para sobreviver. Ou seja, num tempo em que a cibernética nos impulsiona para o futuro, muitos ainda se debatem na pré-história explorando rudimentarmente a natureza. Esse paradoxo tira em muito o nosso brilho, a nossa glória de viajantes interestelares.
O modelo do funcionamento da máquina é o cérebro humano – a chamada “máquina perfeita”. Ela, no entanto, não funciona sozinha. Vive atrelada a um corpo, que a torna caprichosa e falível. O curioso é que nessa falibilidade está a grandeza da máquina humana, a sua possibilidade de, falhando, autocorrigir-se e reorientar-se no rumo não da perfeição, mas da sobrevivência. Aludindo à inteligência do homem, Nietzsche dizia não acreditar na eficiência de uma máquina “que se sabe trabalhando”.
Ora, essa possibilidade da falha, a partir de uma consciência, é a nossa maior riqueza. Se fôssemos perfeitos, de nada nos serviria a liberdade. O paradoxo do ser humano é que o seu maior bem, a sua maior posse vem justamente do que lhe falta, do que nele é lacunoso e incompleto. Ao contrário das máquinas verdadeiras, somos mais eficientes porque “quebramos”.
O tipo mais requintado de máquina é sem dúvida o robô. Em suas fantasias tecnológicas, o homem sonha construir um robô que lhe sirva e, mesmo, que o substitua nos diversos encargos do cotidiano. Mas não apenas isso: um robô que lhe faça companhia, como um cão, e que venha um dia a amá-lo.
O robô nos daria uma afetividade sem fissuras e sem riscos. Não uma ternura escolhida e conquistada, de quem tem alma, mas infalível e certa como um amor... de máquina. O que procuramos na cega disponibilidade do robô é uma compensação para a inconstância dos homens.
Como a fabricação de tal instrumento é impossível, temos que nos contentar com o esquivo e incompleto amor humano. E sonhar, como no filme de Spielberg, com uma engenhoca eletrônica que nos ame sem o ônus da contrapartida, ou seja, sem a exigência de que nos tornemos merecedores desse amor. Isso contraria a natureza desse ou de qualquer outro sentimento, que se alimenta da reciprocidade.