Essa garrafa enrugada e escura foi objeto do desejo da meninada, no transcurso das décadas de 1950 e 60. Não exatamente ela e, sim, o que ela continha: a laranjada em sua plenitude, a explosão de sabor apenas percebida na fase em que a vida conduz às descobertas e ao encantamento.
Provei meu primeiro Crush aos 10 anos de idade, numa bodega de beira de estrada, no interior da Paraíba. O bodegueiro, que não tinha refrigerador, retirou da prateleira uma das 15 ou 20 garrafas ali enfileiradas, abriu-a e me deu sem copo, ali mesmo, no gogó. Meu pai, que então já se servia de uma dose do Conhaque de Alcatrão São João da Barra,
O avanço dos anos sempre me trouxe a impressão de que os sucessores dos fabricantes desta e de outras bebidas do gênero perderam o jeito e a mão dos pioneiros. Os netos não conseguem reproduzir, a contento, o tempero dos avós.
Ou é assim ou, então, são os olhos e a alma de menino que fazem a diferença. Somos nós que perdemos a chance e o tempo necessários à degustação de tudo aquilo que já nos encantou e envolveu.
O septuagenário que hoje eu sou busca, agora, histórias e explicações. Leio que o sabor laranja do Crush (outros advieram) teve, nos Estados Unidos, em 1916, a paternidade do americano Clayton J. Powel. Franqueamentos sucessivos levariam o produto, depois disso, gradativamente, às três Américas.
No Brasil, onde também adquiriu o sabor uva, o Crush já não é mais fabricado. Coisa, porém, que apenas incomodaria o menino que há um tempão eu fui.