1
O maior favor que o escritor pode fazer ao leitor é ser sincero. Geralmente os que fogem à sinceridade o fazem por medo do ridículo, como se as íntimas verdades que expõem não fossem também as de quem o lê. O terreno comum aos homens é o das fraquezas disfarçadas, vilanias escondidas, aspirações muitas vezes inconfessáveis; o leitor agradece a quem o leva a se deparar com tudo isso, que também compõe o seu cenário interior.
2
Há quem diga que não vale a pena se casar, pois o amor acaba. Para mim é justamente o contrário: a efemeridade do amor é a maior justificativa para o casamento, que de alguma forma pode realimentá-lo.
3
De onde vem a culpa, esse império escuro que nos rouba a alma? Não devemos corresponder senão a nós mesmos, no entanto não conseguimos ter isso como uma verdade. Será sempre um problema de cada um conquistar a liberdade interior. A culpa, como todos os freios, precisa ser graduada. O excesso de freio impede que o carro se locomova; a falta dele o faz desembestar, com as terríveis possibilidades que isso implica.
4
O que é o tempo! As garotas bonitas que me ignoravam nas paqueras da Lagoa, ou na calçadinha da praia, hoje são senhoras simpáticas que me cumprimentam e até sorriem para mim. Agora não vale! Eu queria isso antes!!
5
A linguagem é o nosso confessionário. Falar é confortar-se; liberta e consola. Tudo que se subtrai ao desejo se compensa na linguagem. Por isso as pessoas falam, rezam, escrevem tanto.
6
A razão é um demônio que vez por outra precisa dar uma sacudida no anjo da fantasia. Esse anjo, com suas róseas maquinações, pode entorpecer ou cegar. Nessas horas é necessário clarividência para não derrapar no fosso das ilusões.
7
A depressão caracteriza-se por uma defecção (abandono) do ser. Depois que o indivíduo sai da crise, imagina não ser mais o que era. Sente a identidade como um fio tênue, que a custo lhe assegura a autopercepção. Ressente-se de plenitude. Um dos apelos patéticos que o depressivo faz a si mesmo ou a quem tenta ajudá-lo é: quero ser eu de novo.
8
A velhice é por natureza amiga da virtude. O homem só renuncia a certos pecados quando já não está em idade de cometê-los. Por outro lado, um dos maiores pecados da velhice é o ressentimento.
9
Costuma-se dizer que quem não ama a si é incapaz de amar os outros. Penso que é o contrário; quem não ama os outros é incapaz de amar a si. O amor, que é um sentimento basicamente altruísta, não pode ter como referência o ego de cada um. A percepção da incapacidade de amar o outro é que leva ao desamor por si mesmo.
10
Para o artista, a eternidade está no próprio ato de criar. É por esse ato que ele vive a transcendência da sua arte. Caso ela “fique”, ficará para os outros. O artista, enquanto homem, não sentirá o benefício da glória. Já o momento de fazer é tão-somente dele.