VOCÊ ESTÁ ESCREVENDO UM ROMANCE – AQUI “A BATALHA DE OLIVEIROS” (com que peguei o Prêmio INL - Instituto Nacional do Livro, 1988) – QUAN...

Tudo se repete

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VOCÊ ESTÁ ESCREVENDO UM ROMANCE – AQUI “A BATALHA DE OLIVEIROS” (com que peguei o Prêmio INL - Instituto Nacional do Livro, 1988) – QUANDO SEU PROTAGONISTA – OLIVEIROS – conversando com o pai, DIZ QUE NÃO CONSEGUE SUPERAR A ANGÚSTIA DE – PRESO POR MIL DÚVIDAS - não TER acompanhado O IRMÃO – ROLDÃO – NA GUERRILHA DO ARAGUAIA. DE REPENTE VOCÊ NÃO FAZ MAIS DO QUE DIGITAR O QUE OUVE ESSE PAI (com tipo que me evocou Freud) DIZER:

Bom, você pode enxugar o texto imenso do conhecimento, eliminando-lhe as repetições. O incêndio de Moscou em “Guerra e Paz” é o mesmo de Atlanta em “E o Vento Levou”? Reduza os dois a um só. Branca de Neve morde a maçã proibida, como Eva, e se transforma na Bela Adormecida?! Faça isso de novo. E o gentil robô dourado de “Guerra nas Estrelas” – o C3PO – é o mesmo deslumbrante cyborg do “Metrópolis” de Fritz Lang? “O Grito do Ipiranga”, do Pedro Américo, é a mesma cena eternizada pelo Meissonier, no mesmo ano, com Napoleão em Friedland, no lugar de Pedro I no Ipiranga, com quase os mesmos cavaleiros ouriçados ao redor? O início da “Eneida” de Virgílio - “Canto as armas e o varão”... ecoa nos “Lusíadas”? “As armas e os varões assinalados”?

Engancha o dedo indicador no charuto e o tira dentre os dentes, mostrando – em alguns livros abertos - retratos aparentemente característicos do século XIX , que localiza nas ruínas de Pompéia. Mostra a soberba porta modern-style na igreja de Urnes, na Noruega do século XI. Mostra o quanto é moderníssima a arquitetura das ruínas pré-colombianas de Teotihuacan. E exibe a mulher estritamente picasseana pintada na Grécia de vinte séculos a.C. Conta como Abrahão vai sacrificar o filho Isaque e o Anjo substitui o menino por um cordeiro, e que Ifigênia vai ser sacrificada pelo pai, Agamenon, mas é substituída por uma corça, pela deusa Ártemis.

- Nunca botaste teu tino em que era José o pai de Lampião e Maria, a mãe de Virgulino? Nunca botaste teu tino na família dele a fugir sem destino, levando de tudo – até os bodes – que só se tivesse nos mocotós outro Herodes, mudando, será que por coincidência, pra Vila de Nazaré?

E mostra que a matança dos inocentes, na lenda de Jesus, se repete na matança dos inocentes da lenda de Moisés e na matança dos inocentes na lenda de Krishna. E como a história do cestinho de Moisés, em que só o recém-nascido é salvo,
enquanto todos os outros meninos hebreus se afogam no Nilo, se repete e se amplia na da Arca, em que Noé se torna o único sobrevivente do Dilúvio, a passagem curiosamente se reiterando na do minifoguete em que o futuro Super-Homem, ainda bebê, é o único que escapa da destruição do planeta Krypton, depois de seu pai – Jor-El – ter em vão tentado convencer os poderosos de que deveriam ser construídas “arcas-do-espaço” para salvar sua espécie. E José Américo de Almeida teria construído em 1928, com o romance “A Bagaceira”, uma réplica do “Hamlet” na Paraíba. Este romance, por sua vez, seria um modelo premonitório dos acontecimentos que ele mesmo, Zé Américo, deflagraria dois anos depois, na Revolução de 30, passando a viver – ele próprio, literalmente dentro de um palácio, o da Redenção – o papel do Príncipe da Dinamarca, ao tramar o assassinato do Presidente João Pessoa, que o considerava seu herdeiro.

- Veja que Teseu derruba o Minotauro, o Arcanjo põe o pé na garganta de Lúcifer, São Jorge vara o peito do Dragão, Perseu corta a cabeça da Medusa e Davi ergue, triunfante, a cabeçorra degolada, de Golias. E você sabia que a história de Roldão que vai pro Araguaia e de Oliveiros que fica é velhíssima?

Dá uma baforada, estala o isqueiro dourado ao fechá-lo, engancha o indicador no charuto e tira, com a mão esquerda, um livro da estante:

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“A Psicanálise dos Contos de Fada”, de Bruno Bettelheim.

Capítulo: “Contos dos Dois Irmãos” . Lê o trecho sublinhado:

- “O tema dos dois irmãos é central no conto de fada mais antigo, que foi encontrado num papiro egípcio de 1250 a.C. Por mais de três mil anos, desde então, tomou várias formas. Um estudo enumera 770 versões... mas provavelmente há muitas mais! O que todas essas histórias dos Dois Irmãos têm em comum são traços que sugerem a identidade dos heróis, um dos quais é prudente e de bom senso...”

– Você...

- “... mas pronto a arriscar a vida para salvar o outro irmão, que se expõe a perigos terríveis”,

- Viu?

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