Meus estimados leitores e queridas leitoras, sempre, desde que me conheço por gente, gerações mais novas têm desprezo por hábitos e ati...

Conflitos inúteis

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Meus estimados leitores e queridas leitoras, sempre, desde que me conheço por gente, gerações mais novas têm desprezo por hábitos e atitudes da geração anterior.

Mais modernamente acharam um outro jeito de nos aporrinhar o juízo. É o seguinte: passou dos quarenta ou está chegando perto, parece que o cidadão perdeu o selo de garantia diante dessa geração-digital nascida sob a égide da internet. É a geraçãozinha Z, para qual o mundo se apequenou às dimensões de um computador ou de um celular. Não conseguem viver sem essas engenhocas. Fora daí, para eles o mundo perdeu seus encantos e a relação entre as pessoas agora se restringe aos teclados, é por ali que eles conversam, se relacionam, se fazem presentes.

Abraço é coisa fora de moda. Mais que isso; abraço ou quaisquer manifestações de apreço podem virar cringe!

Fiquei inicialmente meio sem saber o que era essa história de cringe. Soube através de minha filha que mora lá nas latitudes de cima a origem do termo. “Cringy”, é o vocábulo cuja origem veio lá da parte de cima do mapa. Professora numa high school, na Pensilvânia, interpelou um aluno para saber o significado.

- What is cringy? – ao que ele respondeu:

- It is like when you see a person over forty-years-old dancing.

Traduzindo ao pé da letra, seria : “é como quando você vê uma pessoa com mais de quarenta anos dançando”. Difícil chegar ao exato significado, mas é bem próximo do nosso: “sem noção”. Também algo como “sentir vergonha alheia”, cafona.

Na verdade é um embate de uma geração chamada de “Millennials” (os nascidos entre 1980 a 1995 nos EUA e de 1980 em diante aqui) contra uma outra geração mais novinha, a que veio depois desta, a chamada de “geração Z”. Esta última já nasceu conectada na internet.

A derradeira geração desanca xingação na anterior por esta, a Millennials, ter hábitos e atitudes que envergonham quem é da geração Z. Essas atitudes é o que chamam de cringe. Vamos tentar relacionar alguma delas para entendermos o vazio que se instalou na cabecinha dessa gente.

Dizer que é mãe ou pai do seu pet é muito cringe. Ir a Disney também é. Tomar café da manhã, usar facebook, ser fã de Harry Potter, assistir a série Friends são outras atitudes muito cringes.

Agora entendo porque nas aulas virtuais, nesses tempos de pandemia, alguns dos meus alunos nem sob tortura abrem as câmeras, Sabem por quê? Porque é cringe assitir aula online com a câmera do notebook aberta. Pode uma coisa dessa?

Outras atitudes consideradas cringes:

Usar pontuação na internet, ficar dizendo que tem boletos para pagar, usar hashtag na legenda do Instagram. Tem mais: rir com o emoji “chorrindo”, usar sapatilha com bico redondo, ler jornal impresso, beber cerveja litrão, usar calça skinny, alugar DVD e VHS na locadora, dizer que somos jovens adultos quando já passamos dos trinta.

Imaginem se daqui a alguns anos se essa geração Z viesse a comandar o planeta. O que seria de nós? Ou dos que ficarem. Ainda bem que muita gente nessa faixa etária não se identifica com essas idiotices. Ainda bem.

Minha geração também achava brega coisas da geração anterior: chamar uma mocinha de broto, dizer “é uma brasa, mora!”, usar lenço, chamar carro de carango, usar calça jeans apertada, gostar de assistir o programa Jovem Guarda, tomar banho em Praia Grande no litoral paulista e outras coisas do mesmo tipo. Tinha mais: comprar camiseta com as inscrições “estive em tal lugar e me lembrei de você”, colocar na varanda uma placa dizendo “seja bem vindo, mas limpe os pés”; pingüim de louça em cima da geladeira e por aí vai.

Acho normal que esses conflitos existam, mas o difícil é entender de como algumas pessoas levam isso tão a sério, como uma espécie de filosofia de vida. A internet se apresentou como uma poderosa ferramenta a serviço da informação, mas se tornou também chão fértil para semear uma variedade insondável de idiotices, como esta que estamos relatando.

Que essa geração Z acorde, pois está ficando para trás. Há gente na idade deles ocupando espaço onde vai ser importante estar e esses patrulheiros perderão a vez por incapacidade intelectual. Tanta coisa importante para pensar e discutir e uns e outros preocupados em ser ou não ser cringe.

Talvez, algum dia essa geração Z, que sofre de bibliofobia; isto é, sente febre, tem urticária, sudorese quando chega perto de um livro, descubra que não há nada mais cringe do que achar alguém cringe.

Será que eles entenderiam isso?

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