Diz-se, não sem razão, que a primeira impressão é a que fica. Sim, mas não sempre. Vejamos. Claro que a impressão inicial tem muita força,...

Primeiras impressões

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Diz-se, não sem razão, que a primeira impressão é a que fica. Sim, mas não sempre. Vejamos. Claro que a impressão inicial tem muita força, até porque é a que fica para sempre quando não temos a oportunidade de aprofundá-la e de revê-la (quando é o caso). Vê-se, portanto, que não raro essa impressão inaugural é equivocada, motivo pelo qual ela não fica, não deve ficar. E aí o que vai ficar é a segunda ou a terceira impressão, aquela que nos oferta a versão mais verdadeira ou mais aproximada da verdade das pessoas e dos fatos. Ainda bem.

Ainda bem porque seria (é) realmente uma pena se não pudéssemos, quando é possível, rever nossas primeiras impressões, ou confirmá-las, se é o caso, de modo a não nos deixarmos levar por uma ideia errada,
formada ao sabor (e ao perigo) de impulsos (ou instintos) apressados. Seria (é) realmente uma pena se não fizéssemos essa revisão que não raro corrige erros e injustiças decorrentes das ideias e sentimentos primeiros, os quais, sabemos bem, muitas vezes são fruto de desinformação ou, pior ainda, de preconceitos.

Somos apresentados a alguém, por exemplo. Conversamos rapidamente, nos despedimos e já firmamos algum juízo sobre a pessoa que acabamos de conhecer. É simpática, é desagradável, é simples, é arrogante, é modesta, é vaidosa, é culta, é ignorante, e assim por diante. Colamos àquela pessoa virtudes e/ou defeitos e com isso formamos sua imagem, aquela que dela guardaremos se não houver a chance de um segundo encontro retificador (ou não). Veja só. Se pensarmos bem, esse julgamento sumário funciona quase como uma condenação do réu sem direito a defesa e a apelação. É justo?

Não, não é. Mas é o que fazemos frequentemente no dia a dia, sem nenhum remorso, não é mesmo? Somos terrivelmente arbitrários (e injustos e preconceituosos) nos nossos julgamentos açodados do cotidiano e quase sempre deixamos as coisas assim mesmo (arbitrárias, injustas e preconceituosas), por falta de tempo, de interesse e de oportunidade. E assim tornamos definitivos juízos que deveriam ser apenas provisórios, com prejuízo para a verdade, para os outros e para nós mesmos, é claro, que permanecemos no erro derivado da primeira impressão.

Quantas amizades e quantos romances não foram frustrados pelo equívoco e pela pressa das primeiras impressões. Nas apresentações e nos primeiros encontros somos todos geralmente inseguros (estou me referindo a pessoas tidas como normais) e essa insegurança pode perfeitamente alterar nossa maneira habitual de ser, nosso “eu” comum, levando o(a) outro(a) a ficar de nós com um retrato falso, um perfil enganoso. E vice-versa, o que nos leva todos a uma generalizada confusão. Muita vez, o que pensamos ser antipatia é apenas timidez, retraimento que impede a pessoa de abrir o sorriso guardado. Uma cara fechada é tão somente uma preocupação e não um temperamento.

O ruim é quando temos uma primeira impressão favorável de alguém e, com o tempo, verificamos o nosso engano. Quanta decepção. E quando isso acontece no terreno afetivo, que desastre. Não é outra a causa dos divórcios e das separações. É terrível constatar que se errou relativamente a alguém a quem se entregou a vida e o coração. E isso ocorre não só nos relacionamentos pouco aprofundados, mas até mesmo em uniões precedidas de longo tempo de conhecimento mútuo dos amantes. Não é brincadeira.

No mundo do trabalho, sabe-se, é fundamental causar-se uma boa primeira impressão. Quanta gente não perdeu uma vaga de emprego ao não impressionar bem o entrevistador, seja quanto à competência,
seja quanto à aparência e aos modos. No caso das candidatas mulheres, esse processo seletivo ainda é, infelizmente, mais cruel, pois, além do mérito profissional, privilegia-se muito a beleza e a elegância, critérios ainda importantes em sociedades não libertas de machismos primários.

No que se refere às decepções tardias, não há o que fazer para preveni-las. Aí só o tempo revelará o erro de nosso julgamento inicial. Mas nos outros casos, se for possível, é sempre recomendável dar-se uma segunda chance aos condenados, já que a experiência mostra – e ensina – quão frágeis – e enganosas – podem ser as primeiras impressões. Pois nem sempre – talvez nunca - as pessoas e as coisas são o que parecem ao primeiro olhar. As primeiras impressões praticamente nunca coincidem com as últimas (para mais ou para menos), do mesmo modo que não coincide (rigorosamente) o que se vê de longe e o que se vê de perto.

Na filosofia, costuma-se - ou costumava-se - distinguir entre aparência e essência (ou fenômeno) das coisas (e das pessoas). Aquela seria uma mera ilusão, a despeito de vir respaldada por nossos sentidos ou por nossa consciência, enquanto estes, a essência e os fenômenos, seriam a verdade ontológica mesma. Digamos, portanto, que as primeiras impressões tenderiam a nos situar na superfície das aparências e não na esfera do ser verdadeiro. Mas, segundo li, até essa distinção filosófica tem caído em desuso, já que hoje tende-se a considerar que “a aparência não esconde a essência, ela a revela: ela é a essência”. Aí a coisa muda de figura: as primeiras impressões, por se ligarem tanto às aparências, não seriam tão ilusórias assim.

De qualquer modo, mesmo com a aparente vitória da aparência, há quem se pergunte se não vale a pena ir – ou procurar ir – além dela, hipótese em que teríamos necessariamente de ir além das primeiras impressões. Dito de outra maneira: é possível alcançarmos a essência? Ou devemos simplesmente renunciar a ela? Não há consenso a respeito.

Aparência, essência, primeiras impressões. Tudo muito movediço, a exigir de nós muita cautela.

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  1. Perfeitamente correta 👊.. as suas colocações ..caro Francisco Gil Messias!!!
    Sempre muito bem vindo os bem elaborados textos que nosso AMIGO Germano Romero faz por editar.
    Paulo Roberto Rocha

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