Napoleão Ângelo, dileto companheiro de jornal, pergunta onde fica o Conjunto João Goulart mencionado em algumas crônicas.
Não acontece muitas vezes: o João Goulart foi construído pelo Ipase num despenhadeiro depois dos Expedicionários que esbarra na Beira Rio. Recebeu esse nome, existiu, portanto... mas perdeu a identidade. No Guia da Cidade de Ernani Seixas já não constava.
Recebeu esse batismo quando Goulart era uma revolução. Nunca um nome fez tremer tanto as bases sociais da nossa vida republicana como esse que Hermano Sá, delegado do Ipase, deu a esse conjunto de casas populares confortáveis como são as do antigo instituto.
Não exagero, a julgar pela remota lembrança do último grande comício na Lagoa na memória da minha geração. Ou da última vez em que a Lagoa serviu de palco para um grande espetáculo político.
Os que vinham de trem, em vagões de carga ou de passageiros, desciam no largo da Estação para se juntar aos que vinham de ônibus, caminhões numa movimentação incomum de faixas, cartazes ao rumor popular do “queremos reforma agrária”.
Da sacada do Paraíba Hotel, o olhar alcançando longe e em volta, desde a praça Pedro Américo ao final da Padre Meira, dava para perguntar se havia porventura alguém que estivesse contra as Reformas.
Gente de andar, falar e aparecer era toda ela a favor. A favor de Jango e das reformas. Pelo povo que se via, dava para acreditar que se ia fazer uma revolução sem reação. O capitão-médico Guillardo Martins Alves, sempre que ia deixar em nossa redação seus textos de divulgação do centro de gastroenterologia Vicentina Goulart, nome que ele deu a esse núcleo de estudos, testemunhou muitas vezes , entre nós, a repercussão desses acontecimentos. Não digo que o médico que me dispensara, com a letra C (incapacidade física), do serviço ao Exército fosse um simpatizante janguista, isso não, mas não dava para ver nele o executor tão seguro e fiel do decreto-lei 477 com que Rui Leitão, em página recente, rememora as cruezas do “AI-5 da Universidade”. Numa foto impressa na abertura de meu livro, Café Alvear, aparecemos, eu, João Manuel e Malaquias Batista no caudal da multidão janguista em sua passagem pela Barão do Triunfo. Entrei no Correio, demorei alguns minutos, e quando voltei às manifestações a Lagoa já não me cabia. O palanque, Jango e as lideranças encobriam-se na multidão.
Era o mundo todo. Cheguei a matutar: “Quem foi que disse que havia classes? “ Ali eram todas as classes.
Nada mais louvável do que preservar o nome de Goulart num conjunto novo autorizado pelo seu governo.Apenas estranhei que fosse tão escondido, numa capoeira depois de uma baixa do Morro da Torre. Não teve a sorte dos que conservam os nomes dos ditadores, ainda que não exista um só prefeito ou um único governador que não jure de pés juntos pela democracia. Apenas Ernani Sátyro, que não sabia disfarçar, segredou-me uma vez, quando a Assembléia inteira atirava em Burity: “Ele quer resolver democraticamente... Não resolve.”