O menino que se chamava Leonardo Francisco Salvatore Laponzina, nascido no Brooklin, filho de pais imigrantes sicilianos, sempre quis ser bailarino, como ele contou em um depoimento dado, em 1962, ao jornalista e produtor Ronaldo Bôscoli:

Aos dezoito anos, com o nome de Lennie Dale (que havia adotado desde criança) terminou o curso no Performing Arts e pretendia iniciar um grupo de danças, quando, segundo ele, “pintou o ‘West Side Story’ e com ele um convite. Negar, como?”
“West Side Story” era uma adaptação de Romeu e Julieta para as ruas de Manhattan. O espetáculo, que estreou na Broadway em 1957, unia as coreografias de Jerome Robbins, a música do conceituado maestro Leonard Bernstein, então regente da Filarmônica de Nova York,
A peça ficou em cartaz, na Broadway, por dois anos. Em 1961, “West Side Story” virou filme (no Brasil, “Amor Sublime Amor”), com a direção de Robert Wise e Jerome Robbins, e se tornou o musical mais premiado da história do cinema, obtendo 10 Oscars (de 11 indicações que recebeu) e várias outras premiações. Algumas músicas de “West Side Story”, como Tonight , Maria , Somewhere e America se tornaram clássicos da canção popular mundial.
Lennie Dale não participou do elenco do filme e, na Broadway, não permaneceu no musical até o final da temporada. Desentendeu-se com o diretor Jerome Robbins e decidiu ir para a Inglaterra. Iniciava, a partir daí, a sua vida aventurosa. Em Londres, Dale estava trabalhando com a cantora Shirley Bassey quando recebeu, de Roma, um telegrama do coreógrafo do filme “Cleópatra”, que estava sendo rodado na Itália. O coreógrafo havia adoecido e pedia para Lennie concluir o seu trabalho na película.
O filme — que tinha a participação do casal Richard Burton e Elizabeth Taylor, famosos atores daqueles anos — é considerado uma das produções mais caras feitas por Hollywood e seus custos teriam abalado as finanças do estúdio 20th Century Fox. Lennie Dale foi o responsável pela coreografia de cenas que envolviam cerca de 500 figurantes. Segundo ele “eu jamais dirigira uma massa tão grande de gente [...] parti para Roma: dirigir o casal mais famoso do mundo”.
Naquela época, estava surgindo a bossa nova, uma verdadeira revolução na música popular do Brasil. Para o jornalista e escritor Ruy Castro, até hoje se discute onde nasceu a bossa nova, “mas não paira nenhuma dúvida quanto ao seu principal endereço de trabalho nos primórdios: Copacabana.”. E, em Copacabana, o domicílio da nova música ficava no Beco das Garrafas. Segundo Ruy Castro, no seu livro “Rio Bossa Nova um roteiro lítero-musical” (Casa da Palavra, 2006):

Para Ronaldo Bôscoli, um dos principais nomes da bossa nova, o jazz ligou, diretamente, Lennie Dale à música que se praticava no Beco das Garrafas. Bôscoli, testemunha presencial do que ocorria no Beco, é quem conta:



Embora seja uma figura quase nunca destacada quando se fala da bossa nova, Lennie Dale cumpriu um papel importante na expansão daquela renovação estética da canção popular brasileira. Para o jornalista Nelson Motta, Lennie Dale “acrescentou profissionalismo às apresentações da bossa-nova. Instituiu um padrão americano de produção e musicais. Além disso, tinha um ritmo e uma musicalidade fantástica". Ronaldo Boscôli contava: “jamais vi Lennie Dale entrar em cena sem ensaiar 50 vezes cada música que iria dançar ou cantar”. Essa contribuição de Dale à profissionalização da bossa nova também é registrada por Ruy Castro:
“Sua ida para o Beco provocou sensação na época, e justamente por essa novidade que ele introduziu: o ensaio. Até então os cantores, os músicos e os produtores só davam uma passadinha no Bottle’s, antes do show, para tentar bicar uns goles na ausência dos proprietários.”
Apesar de não se considerar cantor, Lennie Dale fazia parte dos artistas da gravadora Elenco, a de maior prestígio da bossa nova, que tinha entre os seus contratados os principais nomes do movimento, como Tom Jobim, Vinícius de Moraes, Carlos Lyra, Roberto Menescal, Nara Leão e Baden Powell. Lennie Dale gravou dois discos na Elenco, com o acompanhamento dos principais grupos instrumentais da bossa nova, o Sambalanço Trio, de César Camargo Mariano, e o Bossa Três (Luis Carlos Vinhas, Tião Neto e Edson Machado), com o qual se apresentou no Ed Sullivan Show, um dos programas de maior audiência, nos anos 1960, da televisão norte-americana.
Lennie Dale se tornou um dos principais coreógrafos em atuação no país, trabalhando no teatro e na televisão com os principais artistas brasileiros. Nos anos 1970, Dale passou a liderar o grupo Dzi Croquettes. Passou uma temporada em Paris e, uma semana depois de voltar para o Rio, foi apanhado em uma blitz policial com três cigarros de maconha. Preso, foi condenado a um ano de detenção. Após deixar a prisão, retomou a carreira no Brasil e nos Estados Unidos, onde trabalhou com Liza Minelli. Lennie Dale morreu de AIDS, em 1994, em Nova York. Tinha 57 anos. Poucos, dos que cultuam a bossa nova, se lembram dele.