A insônia é ladra impune. O sono é levado e o lesado fica ridiculamente rolando na cama, espichando os olhos para o céu, escutando o ronco das motos e carros, pensando. Ou se debate ou abre um livro para ler, se é que não escolhe algum filme da sessão coruja. Não sabe o insone que ele ou ela o é.
>Pois, vou dar um nome fictício que deriva da carência de sono: Sônia. Insônia. Nunca mais ela apareceu. Mesmo que não demorasse um minuto dentro da telinha, pois falava alto e gesticulando para quem mais, repassava, com gestos ensaiados dicas para dormir. Engraçado. Sabia de como cair no travesseiro, espalhar as pernas, relaxar a cuca do estresse, mas se confessava insone. Maneira, talvez, de burlar a anônima e invisível plateia suposta.
Uma das sugestões apresentadas por Sônia é respirar fundo e expirar vagarosamente. Os padecentes, revolvendo-se sobre os colchões, na maioria, não conseguem paciência para cumprir, dentro da métrica, como pensa a conselheira. Sônia ocupa seu espaço, se diz padecer de fuga do sono, e transmite princípios práticos para reaver o mergulho no mundo dos sonhos. Dá entrevista a um portador de jaleco branco e discute as possibilidades e impossibilidades do róseo (desculpe, amigo poeta e escritor Wellington Pereira – me apossei do título de um dos seus livros).
O médico acresce atalhos cientificamente comprovados: ligar música clássica, imaginar paisagens exuberantes em flores, lago de águas calmas, rio correndo; enfim, se socorre das prodigalidades da natureza. Sônia é a atriz que finge a insone. Paciente impaciente, se mexendo no sofá, gesticulando em desmedida. Sei de um viciado em jogo do bicho (aqui na Paraíba licitado pelo governador João Agripino Filho, quando ocupante da cadeira-mor do Palácio da Redenção) – até então, era contravenção – o viciado largava os possuídos minchos na borboleta. Só nela apostava. Sonhava quase toda noite com a namorada que perdeu.
Moça é borboleta na cabeça. O tal era antônimo. Sono pesado. Quando tardava o peso das pálpebras, preparava um suco de maracujá. Se ele pudesse participar da bendita entrevista com a dupla da telinha daria a receita da fruta. Mas, continua a conversa: Sônia no bate-bola com o arremedo de doutor, cujo nome esqueci. Desejaria que voltassem à telinha, mas, como já disse, solapam minha vontade em escutá-los em reprise. Mesmo porque, vez ou outra, a ladra me visita e me consola com duas horas a menos do previsto.
Todo o rodeio da conversa culmina com a indicação de uma medicação lançada, sem contraindicações ou efeitos desagradáveis adversos. Todo o blábláblá para o comercial. Sônia toma um comprimidinho, o médico sai de cena, o livro fica aberto e o visor se apaga. Propaganda enganosa? Tenho quase certeza que não mostraram mais as faces no Face. Estão dormindo profundamente, a bandeiras despregadas.