Era o futuro, um espaço imenso que se abriu aos meus olhos. E fui transportado involuntariamente, levado, diferente de antes, quando eu desejei a viagem. Sim, eu estava à frente do tempo, digo, temporalmente, na verdade, paralelamente. Eu conseguia ver o que ainda estava por vir, mas não saíra também do presente. Eu flutuava entre o advir e o agora.
No altar do tempo, eu saltara um pouco adiante, sem me desprender do aqui. E era uma sensação boa, sentia-me como que caminhasse por um corredor de sombras a aliviar o calor, um ambiente de flores que enfeitavam mil galhos, perfumavam com cores. E encobriam um terreno fácil de caminhar. Era quase flutuação, leveza já vivida em tempos idos, colhida avante.
O estado de torpor provocado pelo transporte do tempo era quase palpável, praticamente atingível. Semelhante ao efeito de um bom vinho que amacia o corpo sem embriagar plenamente a alma durante a madrugada chuvosa. Os olhos pesam, as mãos orquestram lentas e musicalmente alheias às ordens do cérebro. Constroem o que se chama de vida.
E o calendário transbordou-se, transportou-se. Hoje já não era o agora, o amanhã estava aqui. O tempo, mais uma vez, soltara-se das falíveis tentativas de prendê-lo. A caixinha de pulso que finge capturá-lo perdera o sentido. O tempo era o regente.
A mente metera-se em questionamentos. Interrogações enfileiradas sem respostas satisfatórias. Eternas “irrespondíveis" dúvidas humanas. Novamente, era o tempo a seu jeito, a dominar passado, presente e futuro. A aproximar e afastar dias, semanas, séculos, segundos. Agora, apresentava de presente um futuro, talvez hipotético, ou mesmo profético.
Eu me vira no amanhã hoje, e hoje no amanhã. Temporalmente, foi registrado como um flash, um raio. Mas o tempo tem durações diferentes. E sabe que eu percebi a viagem mais duradoura, com efeitos permanentes, sinais de possíveis soluções para as charadas humanas.
O tempo reina em diversos ritmos. O menino corre para acelerá-lo, o adulto para administrá-lo e o idoso que se aproxima ainda não conseguiu decifrá-lo... Ficarei com a delícia de vivê-lo. Melhor dar tempo ao tempo.