Mais uma imensa perda humana e cultural para a Paraíba. É assim que vejo, que vemos todos a recente partida de Otinaldo Lourenço, ícone do jornalismo e do rádio paraibanos. E assim vai se alastrando nossa pobreza aldeã, confirmando a sabedoria popular que diz, desalentada: “De onde se tira e não se bota, a tendência é se acabar”. Pois é. É como se, com essas perdas todas, estivéssemos findando, pouco a pouco, nosso parco patrimônio humano, o único que nos coube desde sempre e que não raro temos, burramente, desperdiçado ou desconhecido.
Houve um tempo, por vários anos, em que a de Otinaldo era uma das vozes da Paraíba. Voz bonita, poderosa, altissonante, logo identificável, posto que única. Era a própria voz da antiga Rádio Arapuan, onde ele pontificava ao lado de outros talentos, com sua personalíssima voz límpida e rouca ao mesmo tempo. Voz que era um dom, certamente, e que ele soube transformar em ofício e colocar a serviço da gente que era sua.
Nascido em Surubim, Pernambuco, logo criança e acompanhando os pais veio morar em João Pessoa, cidade que o acolheu, dando-lhe régua e compasso, ao ponto de ambos se confundirem, como costuma acontecer com os destacados filhos amorosos de toda urbe. Desde cedo incorporado à cena humana da cidade, ele, tal como seu irmão José Octávio, passou a ser um dos valores identificáveis da província, daqueles que o público podia apontar no Ponto de Cem Réis ou noutros sítios citadinos: “Olha, lá vai Otinaldo, aquele do rádio de todo dia ...”.
Mas Otinaldo não exauriu seus talentos no jornalismo e no rádio. Formado em Direito pela UFPB, exerceu diversos cargos relacionados à sua formação jurídica, dos quais destaco, entre outros, o de professor universitário e o de Procurador da Junta Comercial do Estado da Paraíba. Em todas as atividades deixou a marca da operosidade e da competência, sem falar, claro, na retidão de caráter e na lhaneza do trato, apanágios que eram seus.
Falei acima em José Octávio, o irmão historiador e intelectual de Otinaldo. E como dissociá-los, pergunto eu, se ambos caminharam sempre juntos ou sempre perto um do outro, de tal modo que falar em um implicava logo em lembrar do outro? Esses notáveis irmãos Arruda Mello não eram siameses, mas se complementavam de várias maneiras, José Octávio, mais moço, sempre reconhecendo a precedência do irmão de mais idade.
E o Otinaldo monarquista? Não se pode deixar de recordar essa faceta singular que tanto marcou a vida pública do jornalista. Segundo afirma Gilson Souto Maior, as convicções monarquistas de Otinaldo datam de seus tempos de colégio, quando as influências de um professor e de suas leituras juvenis convenceram-no definitivamente de que a monarquia e o parlamentarismo eram os melhores caminhos para a estabilidade política e o progresso social do Brasil. A partir daí, aproximou-se da família imperial brasileira, chegando a ser convidado para o casamento da Princesa Maria da Glória, na Espanha, a que, infelizmente, não pode comparecer. Monarquista, mas não intolerante, sempre soube respeitar as posições divergentes, traço de sua personalidade afável.
Sobre isso, conversando recentemente com sua cunhada Amável, esposa de José Octávio, ela destacou o seu espírito conciliador. Na família e na vida, ele atuou sempre no sentido de apaziguar diferenças e aproximar os distantes. Fico, portanto, com essa faceta dele para encerrar esta breve homenagem: a de quem promoveu a paz onde ela estava ausente.
Grande Otinaldo: uma voz, sim, mas muito mais.