Não o conheci pessoalmente, ou seja, nunca fomos apresentados, mas posso dizer que o conhecia mais ou menos de perto, na medida em que um leitor pode conhecer um cronista, partindo do pressuposto de que, de uma forma ou de outra, o cronista se revela em cada crônica, já que toda literatura, assim como toda arte, é autobiográfica.
Leitor contumaz do cronista Martinho Moreira Franco, posso então arriscar-me a dizer que, em certa medida, o conheci, fato que, portanto, autoriza-me a escrever algumas linhas nesta hora em que ele nos deixa desfalcados de sua presença física e intelectual. É claro, reconheço, que podemos escrever sobre a ausência de alguém que não conhecemos de perto ou de longe. É o que acontece geralmente, por exemplo, com os redatores profissionais de obituários. Mas aqui, óbvio, a intenção é outra: trata-se de depor, com os poucos recursos de que disponho, inclusive os emotivos, sobre um companheiro de letras aldeãs, um cronista de escol, mestre meu e de muitos.
Pela antiguidade e pelo talento, Martinho formava na linha de frente do jornalismo e da crônica paraibanos, ao lado de tantos outros, dos quais destaco, pela afinidade, Gonzaga Rodrigues e Luiz Augusto Crispim, este certamente já fazendo no céu muita festa em torno do amigo recém-chegado. Desses três talentos consumados, Martinho tinha um diferencial: cultivava uma discreta e sadia boemia, confessada por ele mesmo em inúmeros textos, cujo tema não raro era fornecido pelo encontro semanal com os confrades.
Como todo bom cronista, Martinho com frequência elegia para assunto personagens, acontecimentos e paisagens da aldeia, de tal modo que é possível acompanhar-se o dia a dia da vida provinciana a partir de seus textos modelares, os quais, a propósito, estão a reclamar quem os organize e selecione para publicação em livro, se é que o próprio Martinho não o fez, o que seria muito bom para seus fãs, agora subtraídos de sua presença.
Essa falta precoce do cronista atingiu em cheio não só seus leitores mas também toda a intelectualidade paraibana, de resto já tão depauperada por outras perdas recentes. A de Martinho, é não apenas uma perda cultural para a Paraíba, mas sobretudo humana, daquelas que deixa um vazio imenso na cena cotidiana da cidade, uma falta que se sente impreenchível, a despeito de saber-se que a vida continua, porque esse é seu fado inescapável e talvez cruel: seguir sempre em frente, de qualquer jeito, deixando os destroços para trás.
Ao grande Martinho, todas as homenagens. Ele merece.