Insignificância
Em que pese os malefícios para o corpo,
devemos arrastar a consciência de nossa insignificância
Jorge Elias Neto
O azul se dissipa
em tons de desespero.
Os segundos corrompem
nossos sonhos,
e a eternidade —
consome toda inocência.
O céu conspira
dentro de mim,
ponto
sujo no útero
da neve.
Do que prende os pés dos sonhos
Esguios germes, arcanos dos polos, de imensas geleiras. Procriando na neve espessa, retardam o caminhar dos insistentes. (A maior morte, em vida, é a impossibilidade.)
Esguios germes, arcanos dos polos, de imensas geleiras. Procriando na neve espessa, retardam o caminhar dos insistentes. (A maior morte, em vida, é a impossibilidade.)
A ordem natural
Vida, esse distúrbio das moléculas que se agrupam e se toleram, que despertam assombradas e se espantam no turbilhão do útero, que choram pela primeira vez, e se expandem a busca de esperanças, que se esquecem da inexistência de possibilidades e se acasalam, que se transformam em autômatos e digladiam com seus iguais, e se espantam, pela derradeira vez, que cambaleiam e tombam, e que não ouvem mais o desespero das carpideiras, quando, já inconscientes e verdadeiras, retornam ao estado natural de fonte energética do Universo.
Vida, esse distúrbio das moléculas que se agrupam e se toleram, que despertam assombradas e se espantam no turbilhão do útero, que choram pela primeira vez, e se expandem a busca de esperanças, que se esquecem da inexistência de possibilidades e se acasalam, que se transformam em autômatos e digladiam com seus iguais, e se espantam, pela derradeira vez, que cambaleiam e tombam, e que não ouvem mais o desespero das carpideiras, quando, já inconscientes e verdadeiras, retornam ao estado natural de fonte energética do Universo.
Discurso para o cadáver
Teus olhos não mentem, essa simplicidade em dizer: tão breve, a vida — enquanto saturamos o ar com subterfúgios e preces. Do exato ponto que se parte — se esquece — o espectro da carne – do irremediável. Da carne à cinza, do torrão de terra ao desprezível mármore — questão alheia — (prevalecerá a vontade do Universo.) Que os vivos tratem da espessura das trevas. A você, o privilégio da dimensão onde se plantam flores. Agradeço a sinceridade azul em teus dedos ao lançar os dados que julgarão os versos impossíveis. E o que disse da memória ... A memória sem lar, desnecessária, posto a ausência cúmplice. Se pudesse te acenderia um cigarro... Deixaria a guimba pendurada em teus lábios. (Como é bela e inútil a última centelha...) Logo chegarão. (A boca aberta da cidade despeja suas crias.) Vestirei a máscara e restarei um momento — breve — (o tempo de observar a indecisão das chamas perante o choro humano.)
Teus olhos não mentem, essa simplicidade em dizer: tão breve, a vida — enquanto saturamos o ar com subterfúgios e preces. Do exato ponto que se parte — se esquece — o espectro da carne – do irremediável. Da carne à cinza, do torrão de terra ao desprezível mármore — questão alheia — (prevalecerá a vontade do Universo.) Que os vivos tratem da espessura das trevas. A você, o privilégio da dimensão onde se plantam flores. Agradeço a sinceridade azul em teus dedos ao lançar os dados que julgarão os versos impossíveis. E o que disse da memória ... A memória sem lar, desnecessária, posto a ausência cúmplice. Se pudesse te acenderia um cigarro... Deixaria a guimba pendurada em teus lábios. (Como é bela e inútil a última centelha...) Logo chegarão. (A boca aberta da cidade despeja suas crias.) Vestirei a máscara e restarei um momento — breve — (o tempo de observar a indecisão das chamas perante o choro humano.)
Um resto de sol no desalento
Ocupo-me de uma febre sem propósito. Modos existem de forjar os dias, principiar universos, rir-se do descomunal segredo da vida... Mas não nessa noite gelada em que persisto centelha. Eis a última pele — a palavra — que se desgarra inapta a prosseguir afirmando o esplendor da verdade.
Ocupo-me de uma febre sem propósito. Modos existem de forjar os dias, principiar universos, rir-se do descomunal segredo da vida... Mas não nessa noite gelada em que persisto centelha. Eis a última pele — a palavra — que se desgarra inapta a prosseguir afirmando o esplendor da verdade.
Pisco*
“Não se acaba facilmente com a civilização das mãos”
Roland Barthes
Congelado,
o pincel dos cílios,
fecha os olhos
ao ilusionismo das cores.
As mãos rasas
— enciclopédicas —
distraem-se do torpor
na prancha de gelo.
A bebida
nos torna invisíveis
— e sagrados.
E a sobriedade
não permite a palavra
— amor.* aguardente andina
Rês
Para José Augusto Carvalho
Eis o meteoro
da impaciência
que destrincha a carne,
que fratura
o tempo e
me descobre
tenro,
palatável,
em meio
aos estilhaços
da urgência.
Nutrido
em úbere
divino,
resfriado nas
evidências da razão
— que não basta.