Assisti, por esses dias, a um documentário sobre essa famosa peça de ir à praia: o biquíni. Não foi a primeira vez que vi a história desse...

Um biquíni de bolinha amarelinha...

Assisti, por esses dias, a um documentário sobre essa famosa peça de ir à praia: o biquíni. Não foi a primeira vez que vi a história desses dois pedaços de pano que as mulheres vestem nas areias.

Sempre ouvi relatos das minhas avós e bisavós indo de trem para Praia Formosa, onde caminhavam e mergulhavam no mar, vestindo camisolões. Se pensarmos no tempo, não faz tanto assim — anos 30?! Menos de um século atrás!

Um pulo no calendário e chego a mim. Lembro de ter usado maiô inteiro quando tinha 9/10 anos. Eram os anos 60. Marisa, prima querida, e eu compramos peças iguais. Tinha uma sainha. Eu achava lindo aquele maiô. Desfilávamos pela Praia do Poço, meninas, indo à Areia Vermelha. Depois já entrei no biquíni. Claro que os primeiros eram grandinhos. Não havia onde comprar. Fazíamos com talentosas costureiras. Aos 14 anos, inventei de costurar um, by myself! Foi uma farra, hein Joana D'Arc? Amiga e exímia costureira. Atrevi-me a cortar um para mim. Ficou meio troncho. Era de bolinha. Vinho e branco. E eu o exibia com uma vaidade extraordinária. Um biquíni feito pelas minhas mãos de tesoura.

Depois veio D. Helena Lyra (in memoriam), mãe da minha concunhada Angela Lyra. E com D. Helena veio o deleite. Biquínis de todas as cores, tamanhos e formas. Lá em casa éramos quatro mulheres, então papai não dava conta de tanto biquíni. Por sinal, no início, ele ficou assustado com aquelas filhas des-nudas por dentro de casa, a caminho do mar. Mas antes tinha o ponto de ônibus, com uma canga ou toalha amarrada na cintura. Muito curto! Muito fino! A gente enrolava, dizia que era moda, que todo mundo usava (o que não era verdade) e lá íamos de argolinha, lacinho, cortininha e outros modelitos.

Foi quando o namorado me trouxe uma "tanga" de presente do Rio de Janeiro. Uma tanga que não era de Tarzan nem de Jane. Papai entrou em polvorosa! Como a sua filha mais velha vai dar esse exemplo? Com uma peça preta, cavadíssima, que deixava as pernas longas e torneadas, a barriga zero... vai se mostrar assim? E as outras irmãs iriam querer uma também, tout de suite! Mas, como interferir, já que o próprio namorado havia trazido do Rio, onde a moda era ditada e adotada? Meu pai ficou a olhar estupefato com o meu exibicionismo. Logo ele, que nunca interveio numa roupa de filha. Usávamos mini saia, decotes e transparência. Éramos um poder de quatro. E ele, silencioso e ensimesmado, sentia sua minoria e acatava nossos des-bundes. Conversava, ouvia e finalmente acatava. Ou não…

Então surgiu Rose de Primo, a musa de Ipanema. O namorado era apaixonado pela moça do biquíni e até acho que, inconscientemente, quis caçar com gato, já que a moça estava longe dos seus desejos mais profundos. Logo eu, magrela, longilínea e de pouco peito, como competir com aquela visão na capa de discos e revistas?

Passado algum tempo, chegou na cidade a marca Viralata (Widson Bandeira e família). Na loja eu era amiga do rei! Comprava em quantidade. Queria todos. Era magrela e me cabia naqueles pequeninos biquínis! Mas não tinha peito. Sempre fui tamanho P no sutiã e M no bumbum. Como conciliar? Nesse troca-troca, íamos inventando os modelos. Lembro também da mãe de Gillete Bezerra, que vendia biquínis de crochê, muito antes de Fernando Gabeira. Usei de todas as cores. Um pedacinho de triângulo — rosa choque, verde limão e bonina! Cores cítricas faziam sucesso no meu corpinho esturricado do sol, embalsamado com coca-cola e água oxigenada para aloirar os pelos! Hoje pagamos o preço, com consultas a dermatologistas e retiradas de cânceres de pele!

Chegou o momento de tocar no assunto topless, que estranhamente não pegou no Brasil. Falso moralismo, uma vez que as mulheres o faziam/fazem nos desfiles do carnaval. Já na praia, o conservadorismo não deixava/deixa nossa nudez ser castigada... Ainda bem que tive a chance de fazê-lo em Baía Formosa, nos anos 80, e na Grécia, em 87!
Na primeira experiência, com a praia deserta e a liberdade de tomar banho nas águas calientes da enseada potiguar; na segunda, em Mikonos e Santorini, ao lado de outras pessoas, de várias idades e corpos distintos, para vivenciar toda essa liberdade de tirar a parte de cima do sutiã, sem alarde ou voyeurismo.

Enquanto assistia ao documentário (passado no Rio de Janeiro), pensei em toda a trajetória do pequeno item. Arrepiei-me quando incluíram os cantores desse hit da época: "Ana Maria entrou na cabine / e foi vestir um biquíni legal / Mas era tão pequenino o biquíni / que Ana Maria sentiu-se mal". Ai ai ai.... Era um biquíni de bolinha amarelinha! Há quanto tempo não ouvia essa música. E as bolinhas saltaram na minha nostalgia pelos meus biquínis. Mas não só. Nostalgia pelos veraneios de Praia Formosa e Praia do Poço. A saudade do jogo de frescobol e das areias do Cabo Branco, onde desfilava com meus biquínis pequeninos, tão caseiros e simplórios, mas que davam a liberdade de romper alguns padrões de comportamento da época.

Graças a Leila Diniz, eu também ousei exibir minhas barrigas grávidas, usando biquínis minúsculos. Sempre achei mulher grávida linda. Fiz questão de ir à praia semi-nua, até quase ir para a maternidade. Sentia-me poderosa nessa ostentação barriguda.

Hoje, mais velha e com o corpo já modificado pelo tempo, tenho dificuldades de comprar um maiô tradicional, mesmo de bolinhas, que adoro. Os que existem no mercado são todos cheios de adereços que, para mim, não combinam com praia. E os biquínis? Continuo a usar, numa referência e reverência a todos os tempos de liberdade das mulheres. Inclusive a minha!

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  1. E não faz dois anos o facebook me botou de castigo por ter levantado em meu espaço uma mostra de obras de Ticiano( 1490 -1576 ) em que constava a sua Vênus de Urbino.

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  2. Parabéns Ana Adelaide!! Adorei a crônica..muito/demais porque vivenciei essas transformações de modas e comportamentos ...em torno dos trajes de banho!! que agora estamos ..ainda mais adiantados ..passando pelos "Fios dentais" e estacionando nas " praias nudistas" e eteceteraetal..
    Paulo Roberto Rocha

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  3. Nesse texto você se desnuda, Ana. Parabéns!

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