Virou água
Quando o voo levantou também fiquei nas nuvens. O “sinto” apertava, deu-me um nó de silêncio. O aeroporto virou água, virou porto, e eu sozinho do lado de fora... por dentro, fiquei a ver navios. Senti falta desse amor que me voa, que me eleva, que me traz que me povoa, sobrevoando sobre as nuvens de mim. Museu Nacional
Perdoa, Luzia! Agora é tarde! A noite arde em tua escuridão! Somos todos sarcófagos! Memórias de um Pavilhão
As últimas vulvas confiscaram a praça vetusta do Pavilhão do Chá. Silhuetas de mariposas desenham estrelas, como se fossem de fantasia e mel, o inebriante olhar do tempo desfeito. Beijos absorvidos comprados, vendidos, caminham sem graça. Balbuciam difusos o que o tempo não disfarça. Recolheram os abraços de esquecidos amores. Lânguidas e soturnas as noites amorteceram desbotando sabores. Agora, os dias se dobram logo cedo à alcova, aos entornos frugais, sozinhas descansam e logo cedo se recolhem porque hoje são todas pardais. O Pavilhão de agora se abre sem aurora, sem tardes, sem luzes nem alardes. O lugar que urge hoje quieto, impreciso deita-se, embalsamando o vazio convertido, inebrio, tristemente se indo. Só as cigarras entendem a solidão dos domingos. Lacrimante
O incolor da lágrima é dolor, é cor que se desbota, dor que sai sem cor quando interna se desloca. A cor da dor é a dor que a alma enforca, remove e, lentamente, de dentro vem, escorre e desemboca. Os mares de Zezita
Para Zezita Matos Quantos mares há no olhar de Zezita quando olha o mar? Canhão de luz, o mar em cena e o sol refletor fazem palco e camarim logo cedo da manhã frente ao mar de Intermares. Tablados e marcações, foco intenso de argaços manifestam-se ampliados no proscênio do terraço. Abre-se o pano: primeiro ato. Um espetáculo soprado pelos antigos pontos acende-se na sua vastidão. Não há palavras. Agora o ponto sopra ventos. São imagens, contos sons do teatro do cinema e um oceano de eventos. O mar faz a vida se quedar: apenas um click um palco e as luzes da ribalta num só ato, vêm depressa iluminar. Nas coxias de além-mar, agigantam-se as lembranças, dolentemente como o tempo sem pressa montando personagens, cinemas, teatros, novelas peça por peça. Quantos mares há no olhar de Zezita quando olha o mar? Um ponto de luz. Transplante "recife está dentro de mim"
Mais uma vez, Recife (!!!) Há quase seis anos, o frevo jogou-me na avenida. Minha folia marca o passo pelos cantos mudos de um hospital. O transplante, que me levou sambado, transformou-se em clarim; fantasia virou pierrô e arlequim. E eu, assim, cada vez mais Recife de tantas pontes... Sobre uma viajei ao meu bloco cirúrgico. Rasgaram-me a noite com bisturi cortando o oco dos becos e esquinas por onde passei. Na outra rua onde amanheci do nono andar descobri-me alado. Mais uma vez Recife (!!!) Hoje escutei um frevo pelos cantos mudos que ficaram em mim.
Quando o voo levantou também fiquei nas nuvens. O “sinto” apertava, deu-me um nó de silêncio. O aeroporto virou água, virou porto, e eu sozinho do lado de fora... por dentro, fiquei a ver navios. Senti falta desse amor que me voa, que me eleva, que me traz que me povoa, sobrevoando sobre as nuvens de mim. Museu Nacional
Perdoa, Luzia! Agora é tarde! A noite arde em tua escuridão! Somos todos sarcófagos! Memórias de um Pavilhão
As últimas vulvas confiscaram a praça vetusta do Pavilhão do Chá. Silhuetas de mariposas desenham estrelas, como se fossem de fantasia e mel, o inebriante olhar do tempo desfeito. Beijos absorvidos comprados, vendidos, caminham sem graça. Balbuciam difusos o que o tempo não disfarça. Recolheram os abraços de esquecidos amores. Lânguidas e soturnas as noites amorteceram desbotando sabores. Agora, os dias se dobram logo cedo à alcova, aos entornos frugais, sozinhas descansam e logo cedo se recolhem porque hoje são todas pardais. O Pavilhão de agora se abre sem aurora, sem tardes, sem luzes nem alardes. O lugar que urge hoje quieto, impreciso deita-se, embalsamando o vazio convertido, inebrio, tristemente se indo. Só as cigarras entendem a solidão dos domingos. Lacrimante
O incolor da lágrima é dolor, é cor que se desbota, dor que sai sem cor quando interna se desloca. A cor da dor é a dor que a alma enforca, remove e, lentamente, de dentro vem, escorre e desemboca. Os mares de Zezita
Para Zezita Matos Quantos mares há no olhar de Zezita quando olha o mar? Canhão de luz, o mar em cena e o sol refletor fazem palco e camarim logo cedo da manhã frente ao mar de Intermares. Tablados e marcações, foco intenso de argaços manifestam-se ampliados no proscênio do terraço. Abre-se o pano: primeiro ato. Um espetáculo soprado pelos antigos pontos acende-se na sua vastidão. Não há palavras. Agora o ponto sopra ventos. São imagens, contos sons do teatro do cinema e um oceano de eventos. O mar faz a vida se quedar: apenas um click um palco e as luzes da ribalta num só ato, vêm depressa iluminar. Nas coxias de além-mar, agigantam-se as lembranças, dolentemente como o tempo sem pressa montando personagens, cinemas, teatros, novelas peça por peça. Quantos mares há no olhar de Zezita quando olha o mar? Um ponto de luz. Transplante "recife está dentro de mim"
Mais uma vez, Recife (!!!) Há quase seis anos, o frevo jogou-me na avenida. Minha folia marca o passo pelos cantos mudos de um hospital. O transplante, que me levou sambado, transformou-se em clarim; fantasia virou pierrô e arlequim. E eu, assim, cada vez mais Recife de tantas pontes... Sobre uma viajei ao meu bloco cirúrgico. Rasgaram-me a noite com bisturi cortando o oco dos becos e esquinas por onde passei. Na outra rua onde amanheci do nono andar descobri-me alado. Mais uma vez Recife (!!!) Hoje escutei um frevo pelos cantos mudos que ficaram em mim.