“Oficina de escritores”, de Stephen Koch, é uma dessas bíblias que todo aspirante a escritor deve conhecer. Nele o autor condensa uma experiência de décadas ensinando a escrita. Ele conhece bem as expectativas, as fantasias e os medos de quem lida com as palavras, mesmo porque na qualidade de autor ficcional sente o problema “por dentro”. Uma coisa é apenas ensinar; outra é também “fazer”, e tirar da experiência lições que se podem passar a outras pessoas.
Escritores são muito sensíveis, e por vezes inseguros, por isso precisam de quem os encoraje e lhes alimente a confiança. Koch faz isso muito bem. Começa por desmitificar o ofício de escrever; para ser escritor precisa-se, obviamente, de algum dom no uso das palavras, mas isso não servirá de nada se não se tiver gosto pela leitura e, sobretudo, muita disposição para praticar. Segundo ele, a escrita não nasce da inspiração – pelo contrário: é começando a escrever que o indivíduo se inspira.
Os escritores profissionais são a prova disso. Escrevem porque precisam dentro de certo prazo entregar os originais aos editores; se fossem aguardar o “sopro”, o “toque”, a “luz” que lhes traria boas ideias, permaneceriam inertes diante da página em branco. Então a alternativa é começar, e esperar que do contágio verbal vá brotando a “febre” que lhes descortina novos sentidos.
A boa ideia pode aparecer, e já trazer o texto pronto, mas são raras as ocasiões em que isso ocorre. Comumente ele precisa ser construído pela memória, pelo pensamento e pela exploração cuidadosa das palavras. Felizmente elas não vêm sozinhas, carregam consigo não apenas outros signos como também pensamentos e conceitos que “puxam” novas palavras. A escrita é a ciência de articular tudo isso, é um pensamento organizado segundo esquemas linguísticos que se multiplicam e se transformam.
O escritor precisa trabalhar com rigor e ciência da língua, para merecer “a frase que surge do nada no momento certo”. Isso não constitui uma dádiva, mas um prêmio ao esforço. E para se ter outros momentos assim, é preciso não parar. Eis como Kock justifica isso:
“Se é a escrita que gera a inspiração – e não o contrário –, a produção abundante leva à abundância de inspiração”.
O básico no trabalho do escritor é sua relação com a linguagem. Ele não sabe até que ponto usa a língua ou é usado por ela. O estilo, expressão desse combate, define quem ganhou. O estilo é a marca, mas não se deve forçá-lo. Se ninguém consegue imitar a maneira de escrever de outra pessoa, muito menos consegue disfarçar a sua. Como diz nosso autor, “até a prosa mais impessoal se torna singularmente própria do escritor, e este é um dos mistérios da escrita”. Um mistério que em certa medida se esclarece quando pensamos que na escrita refletimos profundamente o que somos.