Ninguém mais fala em Newton Rique. Acredito que nem mesmo em Campina Grande, cidade onde nasceu este paraibano operoso, cuja instituição bancária expandiu-se além das fronteiras estaduais, constituindo-se em emblema do empreendedorismo local, numa época que, infelizmente, ficou para trás. Refiro-me ao Banco Industrial de Campina Grande, com filial até no Rio de Janeiro.
Newton Rique chegou a eleger-se prefeito de sua terra, Campina, proeza alcançada apenas por poucos campinenses ilustres de seu tempo, mas governou por poucos meses, tendo sido cassado pelos militares em 1964. Afastado da política, continuou à frente de seu banco até a sua incorporação pelo Banco Mercantil do Brasil, em 1970. Morreu precocemente, aos 55 anos, em 1986.
Fixada em traços largos sua biografia, vamos a um episódio pitoresco de sua vida, resgatado e fixado por João Pinheiro Neto, político e escritor mineiro, em seu livro “Bons e Maus Mineiros (& outros brasileiros)”, Editora Mauad, 1996.
r Coria o ano de 1967. O jornal carioca “Última Hora”, de Samuel Wainer, que já conhecera grandes dias, sufocava sob a pressão dos militares e do empresariado adversário do ex-presidente João Goulart, a quem Wainer fora muito ligado, desde os tempos do derradeiro Getúlio. Com pouquíssima publicidade, o jornal não se sustentava apenas com as vendas dos exemplares. Era preciso correr atrás de empréstimos bancários, o que não era fácil para um jornal no ostracismo político.
João Pinheiro Neto trabalhava à época com Samuel Wainer e se dispôs, com ele, a procurar os banqueiros que pudessem ajudar. Entre outros, foram a Newton Rique. O paraibano recebeu-os cordialmente, já sabedor das dificuldades da “Última Hora”, e concedeu o crédito solicitado com vencimento para daí a sessenta dias. A ideia prévia de Wainer era pagar a dívida com publicidade, pois dinheiro vivo não havia. Segundo Pinheiro Neto, o inteligente Newton Rique já adivinhara essa intenção de Samuel, mas, elegante, fez-se de desentendido. No dia do pagamento, nem com publicidade o banqueiro aceitou a quitação do débito; simplesmente rasgou a promissória, dando uma desculpa qualquer para não constranger ninguém.
Se há gestos que definem uma vida inteira, essa atitude de Newton Rique para com Samuel Wainer bastou para defini-lo como um homem diferenciado, credor da admiração e do respeito públicos. A propósito, a cassação do mandato e dos direitos políticos do banqueiro campinense ilustra, à perfeição, a arbitrariedade dos vitoriosos de 1964. Dizia-se à época que a “limpeza” feita pelos militares na classe política brasileira baseava-se em dois critérios determinantes: subversão e corrupção. Ou seja, para ser cassado, o sujeito deveria ser ou subversivo ou corrupto. Acho difícil enquadrar-se Newton Rique em alguma dessas condições. Foi subversivo? Jamais. Foi corrupto? Nunca se provou. A própria condição de banqueiro, homem do capital por excelência, parece ser bastante para excluir, por si só, a pecha de subversão e corrupção. Mas o fato é que para os poderosos daquele momento nada disso tinha importância. Bastava se querer afastar alguma liderança para que a cassação se consumasse. A justificativa arranjava-se. Ou não.
E a verdade é que dessa forma absolutamente despótica foi ceifada a carreira de muitos e muitos políticos, magistrados, professores e outros brasileiros que, sem serem subversivos nem corruptos, incomodavam de alguma forma os que mandavam e seus áulicos. Aqui na aldeia, sabe-se com toda clareza que a maioria dos cassados não merecia sê-lo por nenhum motivo.
Se hoje ninguém fala mais em Newton Rique não é de se estranhar. O esquecimento, sabemos, é o dia seguinte da glória. Mas estamos lembrando-o aqui e agora, como se deve fazer com um paraibano que, nos seus limites, honrou e honra a Paraíba.