Em tempo de pandemia parece que até a natureza sente sua ação devastadora, pois a devastação é perceptível. Basta olhar as praças e os arredores da cidade para se constatar árvores com menos flores, apesar do período que enceta o colorido dos paus-d’arco, das acácias e das roseiras.
Pode parecer cassimiriano, mas desde quando aportei nesta cidade em 1971, trazendo comigo o frescor do verde de minha terra e a brisa morna dos longos entardeceres de Arara, recorro aos ambientes das praças para o agasalho do verde. Dessa maneira trago de volta o verde das capoeiras de Serraria guardado nas minhas retinas. Capoeiras que alimentam a poesia que retardo expor.
Como disse o poeta, as árvores têm alma e sentem quando lhes ferem o tronco, seja arrancando raízes ou quando cortam galhos, reduzem seus pulmões. Esta pandemia que recolhe todos às incertezas da escuridão, como um machado bronco também perfurou o coração das matas e da vegetação. Então as flores desapareceram, com elas levando o brilho de nossos olhos.
Numa das ruas do meu caminhar matinal existe uma acácia solitária. Olhando-a florida, com amarelos cachos pendurados, meu pensar vai para o tempo quando sorumbático percorria as veredas em torno de Tapuio. Sem me dar conta da perfeição e da multiplicidade das cores da vegetação e do céu com suas nuvens lentamente rolando de um lado a outro, deparava-me com iguais árvores floridas. Olhava-as a passava adiante.
Agora, em face da pandemia que nos recolhe a poeira, percorro lugares da cidade afastando-me do abraço e do aperto de mão, mas alimentando-me das poucas flores que, perdendo o medo, desabrocharam. Enquanto caminho pela rua deserta, desta vez no entardecer, observo por um instante a acácia que me abraça com o intenso amarelo de suas pétalas dependuradas e outras espalhadas pelo chão, sem deixar de lembrar dos ipês e flamboyants de minha terra, recordando que, dias atrás, esta mesma acácia contemplei com a musa de meus poemas.