Deu em A União, em reportagem de Francisco José, ter desabado parte da cobertura do mercado público de Campina Grande, agravando os problemas de acessibilidade, segurança e infraestrutura. No dia seguinte, no mesmo jornal, Laura Luna vem com a mudança do Ponto de Cem Réis em feira de frutas, verduras, eletrônicos, panos de prato, açaí, brinquedos e o mais que coube.
Em Campina um feirante estranha o desprezo dado a cerca de mil negociantes ali instalados e que atendem a muitos outros mil que selam a rotina histórica de atividade e de vida no setor.
É de perguntar: terá investimento de política social que atinja mais direta e ostensivamente o velho problema da distribuição de renda do que intervir num negócio desses?
Façamos as contas: o supermercado, que atrai pelo conforto, pertence a um só dono, de olho e bolsa na demanda de muitos mil clientes. Nessa modalidade moderna, confortável, milhares de fregueses concentram suas compras na conta de um só. Na feira, a economia de mil compradores se distribui, de pronto, com mil vendedores. Haverá investimento social de resultado mais à vista e prático do que esse? O Terceirão está aí, está aí o 4.400, está aí o Mercado Central, abandonado pela clientela dos supermercados e sem espaço, hoje, para a freguesia sem luxo. Pena que Ricardo Coutinho, ao fazer a reforma do velho mercado, não tenha aproveitado a trincha que sobra dos pavilhões, lá em cima, entre a Almeida Barreto e a Princesa Isabel, e aprontado um estacionamento. Esquecia que a freguesia de Lula vulgarizava o automóvel. E como Lula pagou por isso!
Se o Ponto de Cem Réis não é mais o núcleo de comunicação espontânea e de interação cultural da velha cidade, não faz mal que se converta, de forma apresentável, organizada, no mercado popular descrito por Laura Luna e avaliado por uma feirante: “ A gente está aqui porque precisa. E dá, sim, para ser bem organizado.”
Foi-se o tempo da memória, do meio caminho para onde confluíam, século após século, no ato, as vozes e testemunhos de todas as classes. Foi-se o tempo em que a comunicação se resumia no homem, ele mesmo o ator e o instrumento, até que se intrometeram telefone, rádio, televisão, cibernética, esvaziando a função política da praça, que nem mais para comício serve.
A feira preenche esse vazio nas relações humanas, como bem analisa ensaio recente de Carlos Azevedo. Aqui e em qualquer lugar do mundo. Da última vez que andei pelo Rio, o hotel olhava para uma dessas feiras. Desci e entrei na intimidade dos que chegavam da cozinha. E como somos iguais! Não só falando a mesma língua mas escravos da mesma mesa, do mesmo feijão-com-arroz.