Amo Poirot. Li todos os livros de Agatha Christie quando era criança/adolescente/jovem. E Poirot — assim como a idosa detetive amadora Miss Marple — me ensinaram coisas ótimas. Sério. A máxima de Poirot (além da clássica "Use suas celulazinhas cinzentas") é duvidar do que os outros relatam. Muito útil em tempos de fake news. Já Miss Marple ensina que humanos adoram se repetir.
Poirot é apaixonante. Para os leitores e para Agatha, que o fez morrer com ela. A escritora "matou" Poirot em "Cai o Pano" (Curtain), romance escrito na década de 1940, mas guardado em um cofre de banco por mais de três décadas. Segundo as ordens expressas de Agatha, o livro só deveria ser publicado após sua morte. Ela mudou de ideia pouco antes de morrer e liberou a publicação.
Foi uma jogada magistral de Agatha Christie. Além de fazer seu mais famoso personagem se despedir junto com a sua criadora, ela fecha o ciclo, fazendo Poirot, já idoso e doente, voltar ao local de seu primeiro caso, justamente "O Misterioso Caso de Styles", à procura de um assassino. Ou seja, o primeiro e o último romance de Agatha Christie se conectam poderosamente.
Em "Cai o Pano", Hercule Poirot busca a ajuda de seu fiel escudeiro, Arthur Hastings, agora viúvo, para viverem sua última aventura. Poirot reuniu cinco crimes que, aparentemente, tiveram a participação do assassino que está na mansão de Styles. A morte do velho detetive fecha a trama.
Para os fãs (eu incluída), todos apaixonados por Poirot ao longo de 39 livros, a sensação foi de perda de um amigo real. Em 6 de agosto de 1975, o jornal The New York Times publicou um obituário de Poirot na primeira página (com fotografia) para assinalar a sua morte. Não me lembro de um outro personagem ter tido tal honra. Cinco meses depois, morreu Agatha Christie.
As melhores histórias de Poirot são "A Casa Torta" e "Punição para a Inocência". Recomendo. Há séries de TV e filmes muito bons baseados nos livros em que o detetive é protagonista. A mais recente adaptação, é "Morte no Nilo", com Gal Gadot e Kenneth Branagh.
Por fim, uma informação muito interessante sobre "O Misterioso caso de Styles". O livro de estreia daquela que seria uma das maiores best-sellers da história da literatura mundial (um bilhão de exemplares vendidos em língua inglesa e outro bilhão em traduções) foi recusado por seis editoras. O livro foi lançado primeiro nos Estados Unidos (só um ano depois na Inglaterra, país natal da autora) e vendeu dois mil exemplares.
É uma lição sobre perseverança.
Sonia Zaghetto é jornalista e escritora