Singular figura a do marido de professora. Se não mais atualmente, pelo menos há até bem pouco tempo, quando as conquistas sociais femininas não tinham ainda tornado banais as afirmativas mulheres dedicadas ao magistério. Mulheres essas que, durante décadas, foram talvez as únicas a alcançar algum destaque pessoal e profissional numa sociedade brasileira atrasada e machista, que as relegava, genericamente, à subalterna e exclusiva condição de donas de casa e mães de família.
O magistério foi, assim, durante muito tempo uma porta de saída (ou de entrada) para o mundo, talvez a única oportunidade oferecida às mulheres para fugirem ao estreito destino que o matrimônio ( ou a solteirice) então lhes impunha. Circunstância a que se aliava o fato de que os homens pareciam não se interessar muito pelo ensino das primeiras letras, preferindo o magistério de nível intermediário ou superior. Daí o predomínio feminino quase total nas antigas escolas primárias, de alfabetização, como se observa ainda hoje.
Devagar, as mulheres foram impondo sua presença no então chamado ensino médio, alcançando o magistério superior apenas umas poucas, inicialmente. Foi quando se afirmou socialmente, com toda a força, a figura relevante da “professora”, a mulher, casada ou solteira, profissionalmente atuante, reconhecida e respeitada, com direito ao próprio nome e ao próprio prestígio, independentemente do marido.
E o prestígio das professoram era tanto que na maioria dos casos apagava completamente a figura do marido. Para citar apenas uma de nossas docentes mais célebres, dona Daura Santiago Rangel, eterna diretora do Liceu Paraibano, alguém por acaso associou-a um dia a seu cônjuge? Jamais. Ela existia (e brilhava) por si mesma.
Meu sogro foi marido de professora durante os primeiros anos de casado. Ele gostava de dizer, brincando, que penou muito para conquistar seu nome próprio. Só faltou rasgar dinheiro na praça de Esperança. Exageros à parte, a coisa era assim mesmo. Quase um estigma para os varões diminuídos.
A propósito, Gilberto Freyre, em crônica publicada em 1924, referindo-se ao ameno sol de Montreal, dizia não ter ele quase ação, acrescentando: “é como um marido de professora”. Vejam só que conceito tinham esses pobres maridos de nossas docentes. Muitos realmente passaram a ser conhecidos na comunidade apenas como “o marido da professora”, sem direito a identidade própria, transformados em meros apêndices da esposa, condição que, imagino, não devia ser muito agradável aos mais machistas.
O dito popular citado pelo sociólogo no texto antigo naturalmente estava em voga no Recife da época (1924), mas o fato é que a curiosa situação social das professoras e seus maridos continuou em vigor até a segunda metade do século passado, quando, gradativamente, o magistério, de todos os níveis, infelizmente foi perdendo prestígio, como bem sabemos. Hoje, é provável, já nenhum cônjuge é conhecido como “o marido da professora”, nem mesmo nas menores cidades do interior. Não sei, sinceramente, se isso representa avanço ou recuo. O fato é que o prestígio social do magistério feminino se perdeu.
Francisco Gil Messias é cronista e ex-procurador-geral da UFPB