Tenham os gregos conhecido ou não, com bastante antecedência a eclíptica solar, o fato é que, desde que os latinos construíram um calendário regular, a partir do século VIII a. C., o equinócio acontece em setembro, embora o nome desse mês tenha passado por muitas mudanças. O historiador Suetônio nos informa sobre esses fatos. Tibério, filho adotivo de Augusto e seu sucessor (14-37 a. D.), pôs cobro a algumas práticas bajulatórias, quando assumiu o império, vetando que o mês de setembro se chamasse Tibério e o mês de outubro Lívio, em homenagem à sua mãe, Lívia, segunda esposa de Augusto (Suetonius, Liber Tertius Tiberius, XXVI), a exemplo do que ocorrera com os meses Quintilis e Sextilis, que se tornaram Julho e Agosto, em homenagem a Júlio César e a Augusto.
Já Calígula (37-41), sucessor de Tibério, mudou o nome do mês de setembro para Germânico, de modo a homenagear o pai. Seu pai, filho adotivo de Tibério, de quem era sobrinho materno por consanguinidade, recebe esse nome por haver vencido os inimigos germânicos, em 14 a.D., nos momentos seguintes à morte de Augusto (Suetonius, Liber Quartus, Caligula, XV).
O caso de Nero (54-68), sucessor de Cláudio (41-54), foi de pura vaidade megalomaníaca. Suetônio documenta que, querendo propalar a sua fama, Nero nomeou o mês de abril Nerônio, além de ter tomado a decisão de chamar Roma Nerópolis (Suetonius, Liber Sextus, LV). Houve, ainda, uma mudança dos nomes dos meses de Setembro e Outubro por Domiciano. Último dos chamados Doze Césares (81-96 a. D.), Domiciano celebrou dois triunfos, um contra os Catos, povo germânico (83 a. D.), outro contra os Dácios, atuais romenos (89 a. D.). Após esses triunfos alternados, decidiu mudar o nome dos meses de Setembro e de Outubro, a que chamou, respectivamente, Germânico, cognome que se atribuiu, por causa da vitória sobre os Catos, e Domiciano, seu próprio nome – Titus Flauius Domitianus (Suetonius, Liber Octavus Domitianus, XIII).
Qualquer que tenha sido o nome do mês, o equinócio de primavera sempre esteve lá. Ocorrendo neste dia 22 de setembro, ver-se-á, pela segunda vez no ano, uma igualdade de tempo entre claridade e escuridão (a primeira foi em 20 de março, com o equinócio de outono). É o que significa a palavra equinócio: igual à noite ou igualdade das noites (aequinoctium = aequus + nox + ium). Entenda-se que o dia é igual à noite, em horas. A partir de então, o sol, que, na nossa percepção, encontra-se no centro da posição Leste, aumentará ainda mais a sua intensidade,
fazendo a sua "caminhada" para o Sul até estacionar no solstício de verão, em 21 de dezembro, o dia mais longo do ano para nós do hemisfério sul.
Após o solstício, o sol continuará indo para o Sul, em direção à constelação de Capricórnio, que atingirá no dia 19 de janeiro e de onde fará o retorno, em direção ao Norte, diminuindo sua intensidade, para no dia 21 de março de 2021, durante o equinócio de outono, já em Peixes, voltar à posição em que se encontra hoje.
No calendário romano, o equinócio da primavera deste ano cai no décimo dia antes das Kalendas de outubro, coincidindo com o dia da morte do poeta Virgílio (19 a. C.). Amanhã, dia 23 de setembro, nono dia antes das Kalendas de outubro, registra-se, por sua vez, o nascimento de Otávio, em 63 a. C., o mesmo ano da conjuração de Catilina e do consulado de Cícero.
Assim, o mês de setembro, além do equinócio, com o sol em Virgem, registra no dia 22, a morte de um poeta, que renovaria o lirismo pastoral e daria à Caput Mundi o seu maior poema, e, no dia 23, o nascimento de um imperador, que mudaria a feição da capital do mundo, Roma.
Que esta primavera faça ressurgir, em plenitude, a poesia imortal de Virgílio saudando os campos semeados (ARVA) e o amor à simplicidade que a natureza representa, bem como a paz que Augusto conseguiu impor e materializou na ARA PACIS, o Altar da Paz. Vtinam!
Milton Marques Júnior é doutor em letras, professor, escritor e membro da APL