Entre os paraibanos que integram o seleto grupo de referências no Novo Dicionário da Língua Portuguesa de Aurélio Buarque de Holanda, está o escritor e teatrólogo José Bezerra que, com o romance “Fogo”, teve seu nome gravado para na história da literatura brasileira.
Depois de publicado “Fogo”, a pedido do filólogo e dicionarista, Zé Bezerra fez uma intensa pesquisa linguística por toda a Paraíba, colhendo termos e expressões não contidas no romance.

O romance “Fogo” tem como ponto de partida um crime cometido por um rapaz chamado Gedeão, de Pombal, em 1963, época quando ainda o sujeito andava de trabuco e cartucheira na cintura, chibão e chapéu de couro, e a honra era lavada com sangue.
Por um motivo banal Gedeão assassinou um desafeto em Martins, no Rio Grande do Norte, foi preso e a família se desarticulou. Usando de seus dotes de ficcionista e homem de teatro, Zé Bezerra juntou os fatos, associando-os ao Sindicato do Crime que estava crescente no Sertão nordestino, sobretudo em Alagoas, com a atividade de Floro Novaes, e na Paraíba onde começavam a virar lendas os pistoleiros, Joça de Cininha e Antônio Letreiro. Sinais visíveis que afloravam, por meio deles, o poder econômico e político dos últimos coronéis da roça. Figuras do ranço do Nordeste medieval em voga numa escala crescente depois da deportação da Família Imperial.

Estas recordações chegam agora quando, José Bezerra Filho completa oitenta anos, e tanto, para retribuir-lhe em acreditar na minha literatura, tentei, mas não consigo construir outra frase para defini-lo, se não escultor de sonhos. Por todo esse tempo ele protagonizou sonhos. Sonhou e buscou na arte o caminho para essa realização, sempre de forma coletiva. Realizando sonhos e, igualmente, levando outros também a sonhar. Agora, chegou à idade em que lhe é permitido reconstruir o passado. A arte faz todos nós sonharmos, porque a arte é um sonho.
Olhando para os tempos idos, desde a infância até a adolescência, pode-se dizer que Bezerra encontrou obstáculos, mas os transpôs com paciência e perseverança. O patrimônio maior não foi estar citado no Dicionário de Aurélio Buarque de Holanda, mas construir a vida tão desejada, para ter em sua velhice um cantinho onde recostar a cabeça e tirar uma madorna.
José Nunes é poeta, escritor e membro do IHGP