Singelo é o sonho de Reinaldo! Há mais de vinte anos, durante todo o período carnavalesco, faz coberturas jornalísticas através de sua rede de “televisão”. Esses quatro dias são cobertos também pela completude dos guizos da fantasia, efêmeras ilusões de Carnaval. Ele carrega o espírito animado e quase “pujante”, pelas ruas do bairro da Torre, de nossa querida João Pessoa.
Espero ver ainda, numa dessas folias pós-pandêmicas, o pintor Reinaldo com roupa de repórter internacional, paletó e gravata impecáveis; na mão direita, uma réplica de microfone de TV, fazendo as suas “externas”, sempre acompanhado de sua equipe de trabalho. Ele que é um repórter "famoso" e ovacionado pelas suas matérias geniais, retiradas do bloco de suas mais inofensivas graças e das ilusões que ele ousa exibi-las a céu aberto. Quem entender isso haverá de gostar dessa notícia.
A finalidade é uma só: tornar bem humoradas as efusivas alegrias de Carnaval. O mero repórter da TV Ovo, assim como batizou o seu veículo de comunicação”, quer que sempre valha “a pena ver de novo”, a sua fantástica rede de televisão, embora apenas uma só vez no ano.
E sai andando por ali, por acolá, lugares pitorescos dessa festiva "Torre de Babel", que é o mercado da tradicional feira livre do bairro da Torre, onde existe gente falando quase todos os “idiomas".
E assim, as pessoas humildes respondem às suas indagações, com o mesmo jeito espontâneo e cheio de amenidades das suas perguntas ocas, tolas, mas sem maldades. Assim, as entrevistas vão mostrando que ainda podemos ver reportagens da vida, transformadas em matéria de gestos simples, criativos e maneiros. Elas expõem que é possível evitar o tom picante das segundas intenções, da humilhação, por exemplo, ou fomento à violência que tanto aliena os foliões desse imenso Carnaval. Ah! essa alegria efêmera, eternamente levada ao longo do desfile das avenidas desse mundo sambado, às vezes, com tantos enredos perdidamente distorcidos e desarrumados!
Digamos, o protagonista dessa história é apenas um simplório papangu à moda antiga, mas na sua alma travestida de fantoche, configura-se a beleza da pura euforia, que encontra num certo trejeito ameno, o tom da melhor folia. Tudo isso faz com que - saudosamente - sejam embalsamados dentro da gente algo que existiu e ainda desfila na avenida do nosso mundo interior. E é a partir dessas cenas que saímos misturando e configurando esse festejo de marchinhas imortais, confetes & serpentinas, sentindo o cheiro do lança-perfume e, assim, no mesmo ritmo, marcando o passo na memória.
Esse fato me fez lembrar uma reportagem a que assisti em certa emissora de televisão. A repórter fazia uma matéria sobre a celebração de 120 casamentos religiosos em uma cidade do interior paulista. Os casais eram quase todos de terceira idade. Estavam ali a convite do pároco da cidade que, outro dia, numa missa, dissera que todo casamento para ser perfeito teria que ser abençoado por Deus. Ora, ora!!! Os casais daquela cidadezinha costumavam não se casar na igreja. Preferiam se juntar, amigar-se ou, como se nominava popularmente no dizer antigo, “se amancebar.”
Uma das noivas foi indagada pela repórter sobre o que estava sentindo naquela hora. A senhora de aproximadamente uns 75 anos de idade, rindo, rapidamente lhe respondeu:
— “Tô estourando de felicidade, minha fia! Alegria maior não há!”.
A repórter fitou-a e insinuando algo diferente, acrescentou:
— “Apesar de ser num tempo como o de hoje, não é Dona Zefinha?!!!”
A noiva, alheia ao verdadeiro sentido das palavras da repórter, talvez embevecida por um certo estado de graça, a um passo de receber as bênçãos do padre e vendo-se nubente pela primeira vez na vida, olhou para o céu, e com toda fé e leveza, pronunciou:
— “Ainda bem que não vai chover muito, né?! E mesmo se chovesse, a chuva não iria borrar a minha alegria, viu, minha fia!!!”
E, agora, voltando aos estúdios da TV Ovo, instalados sobre as “veias abertas” do bairro da Torre, estou me lembrando de que os lugares onde o pintor Reinaldo traçou as cores de suas alegorias, também estavam cheios de gente feliz. Este ano o repórter nem percebeu que estava neblinando intensamente. E tal qual a noiva entrevistada pela TV verdadeira, ele também não teve medo da chuva. Tinha certeza de que a neblina jamais iria oxidar o seu trabalho brincante, muito menos tirar o brilho dos seus sonhos foleados a repórter e as suas manias postiças pintadas com a tinta branca de seus devaneios.
Saulo Mendonça é escritor, poeta e haikaista