Agro é tech, agro é pop, agro é tudo — é a marcação forte e enérgica das tônicas a nos encher os olhos e o ânimo com a vastidão certinha e alinhada dos campos da agricultura de primeiro mundo cultivada nas planuras do Brasil abaixo da Amazônia.
De janeiro a março, nesses três primeiros meses do ano, a exportação fez recorde na safra de soja, de milho, nada abaixo de 70, 80, a 120 milhões de toneladas por espécie. E mais frutas, algodão, carnes, China, América e Estados Unidos com a garantia de provisões nunca vistas nesses campos de fazer inveja, em beleza, aos vinhedos da Borgonha.
Os nossos, bem mais extensos, continentais, igualmente alinhados na régua e compasso como exige o design do novo capitalismo.
Se o campo é de soja, só se vê soja. Se é de algodão, de milho, seja de que for, nada interfere na uniformidade do plantio. Como nos nossos antigos campos de agave, não cedendo um palmo para a sombra de uma árvore de fruta ou de flor. Não é nova essa utilização avara da terra: quando vendemos nosso sítio, a casa de morada sombreada docemente de fruteiras, um mês depois veio tudo abaixo.
Agora, no fastígio do Agrotech, onde se vê o homem? Nas filas da Caixa. A mão que planta e colhe é outra, é de aço como o coração da nova agricultura. Apenas e ainda por felicidade, resta um homem em cada máquina, o labor solidário cedendo a vaga ao lucro.
Não sei quem me disse, pois morreram todos: “Não foi o bicudo que acabou a nossa primazia no algodão, muito menos a falta de mercado; o que arrasou nosso meio de vida histórico foi a força poderosa do capital sob o domínio automático da tecnologia. Do tech. O algodão da meia e do roçado, colhido a mão, mais gente do que lavoura, morrera muito antes do bicudo.” Creio ter sido coisa da visão de Ronald, ou de Adalberto ou de Chaguinha.
A ciência de Celso Furtado ainda via alternativa: levar as populações do semiárido para as boas terras do Maranhão, do Brasil Central, vez que a zona da mata nordestina é privilegio secular da monocultura açucareira ou de pequenas propriedades com cultura de subsistência. Mas numa entrevista de 1998, com interlocução de Maria da Conceição Tavares e Manuel Correia de Andrade, a fortaleza de sua fé ainda resistia na crença de uma alternativa planejada de volta do homem ao campo.
As cidades não cabem mais. A pandemia nos faz ver, horrivelmente, a que níveis chegam as hordas do desemprego. Os que não leem as estatísticas do IBGE, veem a trágica realidade no surto desesperado das filas que dormem ou pernoitam nas calcadas a apanhar a subsistência. Por mais que o vírus ataque e mostre a sua cara nas covas enfileiradas a régua e compasso. É a estética que sobra para 80 milhões de brasileiros advertidos para não sair de casa. De que casa?
Gonzaga Rodrigues é escritor e membro da APL