"Existe um ser com dois pés sobre a terra, também com quatro pés, de si uma voz, quanto com três pés. Sozinho modifica a natureza tanto dos que rastejam sobre a terra, quanto dos que surgem acima no éter e abaixo no mar. Mas quando anda apoiando-se em vários pés, então, a sua força torna-se mais fraca para os seus membros.(Tradução nossa)"
O enigma está posto! Até ali, ninguém conseguira decifrá-lo, sendo todos devorados pela Esfinge ao tentar fazê-lo. Então, conduzido por um destino há muito determinado pela maldição que atravessa a sua família, Édipo chega a Tebas, retornando às suas origens. Inquirido pelo monstro, ele soluciona o enigma, entretanto, apenas parcialmente.
A cegueira, que é própria do herói trágico, obsta que Édipo compreenda-o por completo. Ele não enxerga que esse ser que a Esfinge descreve é ele próprio. Tal cegueira está no cerne das ações do herói ao longo da fabulação de Sófocles.
Podendo ser analisada em dois níveis, a peça mostra dois reconhecimentos. No primeiro, vem-se a saber que ele é o miasma que polui a cidade e não o seu salvador. No segundo, aquele de fato trágico, ele compartilha o leito conjugal com a sua própria mãe, logo, ele é a maldição.
Pode-se pensar, tomando-se a Psicanálise como instrumento de análise, que o oráculo proferido pela sacerdotisa de Apolo, determinante para a sua saída de Corinto e chegada a Tebas, diz respeito à pulsão do desejo inconsciente, Eros, que é direcionado àqueles com quem primeiramente na vida nos relacionamos, fundamentais para a nossa constituição como sujeitos, a mãe, ou sua substituta, e o pai, ou seu substituto.
Édipo, premido pelo oráculo, tenta fugir da inexorabilidade do seu destino, mas tragicamente cumpre-o, e ao cumpri-lo, alcança a satisfação do desejo inconsciente, cuja realização acarreta a sua derrocada.
Na tela de Ingres ("Édipo resolve o enigma da esfinge"), que se encontra no Museu do Louvre, Paris, vemos Édipo diante da Esfinge, às portas de Tebas, e mais ao fundo, um transeunte passando, apavorado com a cena, o que prenuncia o horror que virá pela frente....
Alcione Albertim é professora de literatura e línguas clássicas