Voz sumida, aquele murmúrio de palavras indistintas. Com a concha da mão imprenso o ouvido ao fone. Quem... por favor? O ciciar ainda não diz se é de gente ou do vento. Melhora um pouco, é de gente mulher, sim. A impaciência relaxa para uma escuta mais calma, até fagueira. Os que chegam a essa distância de vida compreendem.
Resta saber quem é Ina... lina? Falta alguma coisa.
“É Ce..lina, seu Gonzaga, Celina!”
Ah, sim... Agora vamos atrás das duas ou três Celinas que a memória, mesmo pronta, demora a definir.
“É Celina de João Edson!”- abre-se a cortina.
Que instantâneo de luz, de bons momentos! Apesar da distância no tempo, em tudo.

Nessa ida e vinda das beldades, na festa do bairro, colei os olhos nos de Celina, ela quebrando e eu sem sair do lugar, doido pra ir mas a timidez me segurando. Foi mais audaz João Edson, certamente atraído pelo mesmo olhar risonho, a mesma fonte de sedução, eu julgando que fosse pra mim e João, sem a menor dúvida, para ele. Só ela sabia.

- Não me digam que estão aqui com esse coronavírus! – foi como atendi neste sábado.
- Não é isso, Gonzaga, Edson partiu no último dia de junho. (...) Fugiu da quarentena em casa, temendo contagiar, internou-se e não resistiu. Pensávamos ...
Não deu para ouvir. Desta vez não foi o telefone, nem meus ouvidos. Foi a vida mesma... Para não dizer a morte.
Gonzaga Rodrigues é escritor e membro da APL