São outros tempos e as bandas fugiram dos coretos. O da Praça Venâncio Neiva: esquecido num canto do logradouro; o da Praça da Independência: invadido por flores.
Em outras épocas, ao derredor das poéticas construções, embutidos entre sombras alcoviteiras, namorados se entrelaçavam, descobriam constelações, viam estrelas explodirem na mágica ternura.
Nas noites do domingo ou feriados, a batuta dos maestros, geralmente da Polícia Militar, saracoteava no ar, fazendo acordes de instrumentos musicais soprarem melodias variadas de encantamento.
Amigos em bando. Moças rodopiando. No Pavilhão do Chá, rapazolas ficavam à espreita com os olhares furtivos, acompanhando os passos das meninas. Os mais idosos comentando cotidianas ocorrências. Havia um remanescente daqueles anos que, quase todo esmorecer da tarde, se punha no templo das retretas; não se sabia a razão. Entregava-se a meditações quase monacais. Lembranças. Sugiro: talvez um daqueles namorados que frequentavam a praça, quando nos encantos da juventude. Seria? Figura enigmática, hoje desaparecida, foi vista por muitos (eu, não) e serviu de comentários os mais diversos...
Atualmente, os transeuntes são apressados, não olham a grama, as plantas com as palmas abertas, nem as árvores centenárias. A passos nervosos, extensos, principalmente à noite, levam o medo de alguma abordagem inconveniente em busca de celular ou mixarias contidas nas bolsas e carteiras. Na Venâncio Neiva, na Independência, há uma evasão de frequentadores. Os banquinhos estão vagos, enquanto o domínio da perigosa noite grassa sobre os dois belos recantos.
O visitante do coreto, de que falamos, parecia um mentecapto, maníaco, entregue a ócio bobo. Isolado, a olhar para a encurvada ladeira da Rua da República, naquela hora de costume, à espera do sol finar-se por trás do rio Sanhauá. Assoviava alto um dobrado tocado nas famosas retretas. Já noite feita, descia os degraus do coreto da Venâncio Neiva. Enfiava-se pela rua Índio Piragibe. Ninguém jamais soube onde morava. Chamavam-no de flautista. Gostava de solfejar o “Cisne Branco”. Talvez um marinheiro de porto perdido, mergulhado nas ondas plácidas do passado; parecia ex-componente da banda que tocava na retreta. Pelo menos, um sinal que restara daqueles conjuntos de metal cromado...
José Leite Guerra é bacharel em direito, poeta e cronista