O mundo contemporâneo impõe a todos nós um grande desafio: conviver com a alteridade. Está cada vez mais difícil compreender o lugar do outro, aceitar as divergências, respeitar os pensamentos e opiniões discordantes. Principalmente quando o debate se estabelece na manifestação das convicções e ideias políticas.
Nessas ocasiões, movidos quase sempre por paixões, somos alcançados por sentimentos de irritação e aborrecimento, permitindo que as emoções falem mais alto. Perdemos o equilíbrio racional, passamos a agir e falar por impulsos, desprezando o necessário sentido da ponderação, do raciocínio lógico, do discernimento. As tensões políticas provocam ânimos acirrados e tendemos a definir negativamente tudo o que contrarie o nosso pensamento.
No entanto, nunca devemos dar oportunidade a que percamos o direito de ser diferente, porque assim estaremos abrindo mão do inalienável privilégio de ser livre, desde que a colisão de ideias se dê buscando prevalecer a cultura do diálogo. Precisamos exercitar diariamente a nossa capacidade de aceitar as preferências que não se harmonizam com as nossas. Afinal de contas, pensamentos diferentes enriquecem o conhecimento. Esse é o princípio da boa convivência.
Não devemos nunca exigir que o outro se torne igual a nós. Afastar de vez o entendimento de que as diferenças sejam vistas como algo perigoso. É necessário estarmos sempre com o coração aberto para o caminho do entendimento, mesmo quando as desigualdades sejam bastante explícitas. Testarmos nossa sabedoria no enfrentamento de situações que colocam em risco as amizades por conta de discussões políticas.
Ser diferente é ter o modo próprio de refletir sobre as coisas e formar o seu juízo de valor. Ser diferente é ter a liberdade de seguir o caminho que escolheu, sem submeter-se às vontades alheias. Ser diferente é cogitar alternativas, recusando-se a assumir postura de “maria vai com as outras”, pelo receio de ser mal compreendido. Ser diferente é ter a percepção de que não deve caminhar com o rebanho, valorizando o senso crítico. Ser diferente é assumir suas singularidades como indivíduo. Ser diferente é resistir às influências ditadas pelos modismos ou pelos discursos persuasivos que desejam promover transformações na sua personalidade e na sua consciência.
Por isso, jamais devemos abdicar do direito de ser diferente. Todavia, cada vez mais, procurando perceber e aceitar que os outros do nosso convívio possam ser também diferentes. Se possível, aprendermos com essas diferenças. Porém, o mais importante, é não assentirmos que eventuais discrepâncias no pensar possam finalizar amizades.
Rui Leitão é jornalista e escritor