Por acaso, encontrei o vendedor de pirulitos. Arrumada na tábua perfurada, a delícia daqueles bombons que eu não via há muito tempo. Interessante como os usos e costumes vão se esfumando: antes, passando pelas ruas, muitos deles transitavam, as crianças esperando a hora, cutucando os pais para pedir as moedas; à época, ninguém tinha nenhum saber sobre diabetes, triglicérides, colesterol bom ou mau.

Não ousaria, jamais, quebrar o seu isolamento em meio a tanto barulho e expectativas, comentários, um transistor alto tocando safadões irritantes. O homem se perdeu de minha vista. Faltava tempo para a chegada do ônibus de meu destino. Levantei-me e saí a seu encalço. Percorri todos os becos e recintos da rodoviária como detetive improvisado. Mas, afinal, que estava fazendo eu, prestes a viajar, faltando meia-hora, à procura do vendedor?
Pensei, racionalmente, em suspender a busca julgada por mim mesmo desnecessária e infrutífera. A raridade me atraiu em saber algo sobre o trabalho descartado pelas lufadas do tempo. Já estava a desistir, quando o vi bebendo água mineral.

O relógio apontava as proximidades da saída do ônibus. Voltei a me indagar o motivo de haver comprado o que poderia ter dispensado. Não existiria explicação. Mas me senti, de repente, aquele menino, que esperava ansioso a passagem do vendedor de pirulitos, tocando o triângulo, subindo a rua onde passei a infância. Chamavam-no de Chico Doçura. Mas, ao contrário do vendedor da rodoviária, amargo, Chico era sorridente, brincalhão, alvoroçado e cantava para os fregueses.
José Leite Guerra é bacharel em direito, poeta e cronista