Luzia
Acho lindo o nome Luzia
Um nome que veio lá da Espanha
Mas reluz no sertão
Na feira de rua
Na mão de uma santa
No vestido branco de cambraia bordada
De uma moça morena, robusta
De peitos fortes e cabelos escuros
Derramados em duas cascatas
Uma sobre o ombro
A outra pelas costas...
Luzia
Esse nome é lindo como um candeeiro
Bom de ser pronunciado de noite
A luz fraquinha
Cheiro de querosene queimando
Chá de erva-doce
Café quentinho
Banho tomado
E respiração apressada
Por causa de beijos roubados
Abraços proibidos
E mãos agoniadas
No portão que dá para a calçada
— Anda, Luzia! Entra que é pra não ficar falada…
Adelaide
Adelaide é o nome da minha primeira saudade.
A primeira de que tenho lembrança.
Dona Adelaide tocava piano quando acordava contente.
Acho que era a única pessoa que tinha um piano
Naquela cidade do sertão chamada Salgueiro.
É pra lá que a minha memória se dirige quando penso na infância.
Um dia, descobri que há uma cidade na Austrália chamada Adelaide.
Nem faço ideia de onde fica.
Mas imagino uma casa com varanda de madeira, pintada de branco.
Nela, um homem, numa cadeira de balanço, usando chapéu e botas, mira um campo imenso, um horizonte que se acaba num sol tremulante, que se põe lá em Salgueiro.
Fecho os olhos e lembro daquela Adelaide, tocando piano,
Na cidade onde a minha infância se pôs e nunca mais amanheceu.
Adelaide.
Saudade.
Cidade.
Severina
Um nome à espera de chuva
Um nome que quando venta
Venta com um bafo de calor e poeira
Um nome feito de arame farpado
Mandacaru
Pedras, sol do meio dia...
Uma lagartixa passeia esperando nada
Olha de um lado pro outro
Cumprimenta João Cabral
de Melo Neto, de Melo Neto, de Melo Neto
Severine
Uma Severina de maçãs e framboesas
Uma bela que arde
Antes que seja tarde
No Marais ou na praia de Boa Viagem
Buñuel e Alceu
Faltou-lhes a coragem
Severinas não são para homens de pouca fé
Para umas, chuva
Para outras, umas poucas gotas
E orvalham-se
Uma linda fruta de polpa branca
E pequenas sementes
Suculenta
Lenta
Lenta
Severinas são mulheres submersas no chão
Responsáveis pelo repovoamento da terra seca .
Nelson Barros é psicólogo e cronista