Lembro dos tempos de infância que na minha cidade, Serraria, tinha uma praça e nela havia um coreto rodeado de quatro imponentes palmeiras, que deixavam o ambiente ainda mais aconchegante. Quando eu ia lá, gostava de ficar sentado no banco, observando o movimento da rua, sem desviar o olhar do relógio da matriz para não esquecer a hora de retornar ao sítio.
A praça é o espelho da cidade. Lugar onde se passam agradáveis momentos de lazer e animadas conversas com amigos.
Na praça constroem-se sonhos que nem sempre são realizados. Por isso aquela praça anda comigo, é parte de minhas quimeras de adolescente. Mas destruíram a praça, reduzindo a paisagem de nossos olhares.
Na praça é possível descobrir a cordialidade entre os habitantes da cidade. Lugar onde se planta esperança, onde se colhe sonhos.
Há milênios a praça tem papel importante na vida das pessoas e continuará, mesmo que a insegurança arrede as famílias.
No tempo de Jesus, quando se desejava contratar alguém para o trabalho, recorria-se às praças. O Mestre até usou-a em uma parábola, para falar de seu reino aos trabalhadores.
Quando destruíram o coreto da praça de nossa infância, arrancaram um pedaço de nós. Os destroços e a poeira levaram consigo a história de nossos ancestrais, restando o retrato na parede onde as folhas das palmeiras ainda tremulam.
A cidade que não cuida de suas praças está fadada ao esquecimento. Quanto encantamento no olhar havia quando, ao final das tardes e primeiras horas das noites, as pessoas conversavam nesse local.
A antiga praça de Serraria faz parte das saudades que compõem a paisagem que habita toda a minha poesia. Em tudo que presenciei na tenra idade, hoje, olhando para o passado, percebo que a natureza e os antigos casarões de minha terra são habitantes de minha poesia.
Foram as intermitências deste sonho que permitiram suportar a ausência e a dor do trabalho árduo durante mais de seis décadas. Quando conduzido para outras paisagens, alimentando-me das imagens que carregava de Serraria, sejam as que estavam gravadas na memória ou estampadas na fotografia, sempre estavam o coreto da praça e seu entorno, guardados como reminiscências.
Como diria Neruda, este poeta chinelo que nos consola com sua poesia, “minha vida é uma vida feita de todas as vidas: a vida do poeta”. Minha travessia começou ali, com personagens de todas as épocas misturando-se às de hoje, que estão ao nosso lado.
O silêncio da praça sucumbiu na poeira e nos destroços, mas ressurgirá nas folhagens verdes da esperança, espalhadas pelo vento. Um vento que sussurra como música entre as palmeiras que circundam nossa cidade.
A reconstrução deste coreto teria um forte simbolismo cultural, fazendo recordar com emoção os dias de uma Serraria ainda em construção. Fica a sugestão.
José Nunes é poeta, escritor e membro do IHGP