Picasso disse – e com toda razão – que a inspiração existe, pero tiene que encontrarte trabajando. Não sou modelo pra ninguém, mas de alguma coisa deve servir a experiência.
Quando resolvi que faria meu primeiro poema longo – Trigal com Corvos – sabia que isso não iria ser fácil e fui paciente. Trabalhei nele uns dez anos, enquanto me ocupava, também, ora com um painel complexo, como o “Homenagem a Shakespeare”, ora com uma e outra das muitas narrativas com que iria compor minha História Universal da Angústia.
Quando pensei que o Trigal estava pronto para safra, fui um dos 1180 candidatos ao Prêmio Nestlé de Literatura, em que fiquei entre os 11 finalistas. E como não fui nenhum dos três premiados, vi que tinha de trabalhar mais. Fiz isso e, com esse livro, peguei o Prêmio João Cabral de Melo Neto, da UBE – Rio, 2005 e uma surpreendente fortuna crítica.
Onze anos antes eu já estava no terceiro mês de minha versão do Jardim das Delícias, de Bosch, quando senti que teria de ver o original no Museu do Prado. Endividei-me - não muito - tirando partido da paridade do dólar, na época - e, quando voltei, devidamente revigorado, investi mais três meses na tela. Não que eu tenha feito nenhuma obra-prima, mas, mal lhe botei data e assinatura, calhou do Ednaldo do Egypto me pedir ajuda na construção do seu teatro, lá em Manaíra. Como eu não tinha dinheiro vivo, devido à recente viagem, doei o quadro, que ele rifou. Parece tempo perdido, mas eu ... precisava ver o que o genial flamengo sentira ao fazer seu Opus Magnum, e isso ficará comigo.
A paciência vem de longe. Quando, pela primeira vez dei por terminado meu primeiro romance, Israel Rêmora, ouvi Jurandy Moura me dizer que ele estava muito ruim. No que fiz menção de retrucar, ele prosseguiu: “Ponha a data de hoje na capa, vá fazer outra coisa e, daqui a seis meses releia o que fez. Vai ver que, quando a gente termina um trabalho desse, não tem muita noção do que deixou de fazer ou fez demais”. Escrevi A Canga, e, ao reler o Israel, tive um baque. Reduzi o romance a um terço, dei-o para o Barreto Neto, que me falou do Prêmio Fernando Chinaglia e disse que se eu não o vencesse, ele não acreditaria em mais concurso nenhum. Venci-o. Isso foi em 74. Em 75 o volume saiu pela Record.
A coisa se repetiu quando enviei os originais de outro romance, “Relato de Prócula”, a Ivo Barroso, Esdras do Nascimento e Carlos Trigueiro, do Rio, Hugo Almeida, em São Paulo. Hugo e Esdras me elogiaram, Trigueiro, não, Ivo me desancou. Ouvi o Ivo. Refiz o romance e o remeti a um quinto leitor, Paulo Bentancur, lá de Porto Alegre e, tudo nos trinques, ganhei o Prêmio João Fagundes de Menezes, da mesma UBE-Rio, 2010.
A dedicatória de uma das minha criações seguintes, o “rimance” “A Engenhosa Tragédia de Dulcineia e Trancoso”, diz isto:
- Ao Ivo Barroso, Joedson Adriano e Expedito Ferraz Jr, porque me levaram a trabalhar mais um ano e meio neste livro, além do que eu julgava necessário.
Jurandy Moura me fez ver o quanto nos envolvemos com que o estamos produzindo e que é necessário nos dar um tempo mais de esforço, onde isso já parece insuportável. É preciso esperar. Quem espera sempre cansa, é verdade, mas é assim que se vê melhor o que se quer... e o alcança.
W. J. Solha é dramaturgo, artista plástico e poeta