Gosto da palavra “namorar”. É um dos verbos mais puros da língua portuguesa. Mesmo quando por eufemismo designa outra coisa (a ligação entre amantes, por exemplo), “namorar” sugere mais ternura do que desejo. É uma palavra tão embebida em frescor adolescente, que deveria ser proibida aos que se relacionam num nível mais avançado.
Os amantes resfolegam; os namorados suspiram. O prazer neles é mais ânsia do que consumação. Os amantes têm um antes e um depois, quando se quebra o encanto. Os namorados vivem num eterno antes, cheio de expectativa e encantamento. Os amantes têm diante de si o corpo explícito, feito carne, aberto na franca exposição da entrega. Os namorados tateiam no escuro o corpo escondido, espiritualizado, que sonham um dia possuir.
Namorado também não é ficante. O ficante é inimigo de quem ele beija ou apalpa numa intimidade destituída de preâmbulos e promessas. Quer o prazer imediato, e não apenas com um só. Quer a diversidade e o número. Quanto mais garotas ou garotos houver, melhor, já que nenhum deles conta mesmo por si. Os namorados, se pudessem, construiriam um mundo só para os dois.
Namorado não quer a presa fácil; quer o árduo e delicioso trabalho da conquista, que se dá aos poucos, num crescendo de intimidade. Quer seduzir, o que só é possível quando o outro opõe resistência pelo que tem de íntimo, inalienável, pessoal. Como no “fica” ninguém resiste, não cabem nele os artifícios da sedução. E sem o trabalho de seduzir não há por que mobilizar a linguagem e escrever cartões, bilhetes, poemas (muitas vezes furtados), na tentativa de dizer ao outro o que se sente.
Um dos problemas dos relacionamentos de hoje é que se namora pouco. Vivemos numa época objetiva, pragmática, em que ninguém quer perder tempo. Na pressa de atingir logo a meta, os parceiros se alheiam do que há de fascinante no percurso. O essencial do namoro não está no ponto de chegada, mas nas estratégias que levam a ele. É um caminho pontuado de temores e arrebatamentos, cujo sentido está mais em percorrê-lo do que em atingir o objetivo.
Mesmo porque o objetivo nunca é muito claro, já que os namorados vivem um tanto perdidos um no outro. Faz parte do processo ver o parceiro como enigma e espera. Como possibilidade de alguma coisa que nenhum deles sabe ainda o que é. Sabe apenas que deve aproveitar o momento antes que ele se transforme, e os dois sejam convocados a decidir que destino vão se dar. Enquanto namoram, o tempo faz seu trabalho, que consiste na lenta e inflexível erosão da fantasia.
Sei que estou romantizando, mas não existe namoro sem romantização. Por isso ele só acontece entre os que ainda não conhecem bem o mundo. Ou, se o conhecem, preferem ignorar-lhe a feiura e apostar no castelo de sonhos que (eles sabem) muito em breve virará saudade. A saudade dos namorados é a de um tempo em que eles eram outros, menos táticos e frios. E mais capazes de esperança na vida e no amor.
Chico Viana é doutor em teoria literária, professor e escritor