Na proximidade do crepúsculo é normal o trabalhador retornar a casa, esperançoso ou ansioso, aguardando o descanso noturno, seja ele residente na cidade ou na roça.
Voltar para casa é o desejo de todos, mesmo que a sua residência seja uma choupana de taipa ou papelão, mas é um cantinho ao qual chamamos de “minha casa”.
Neste tempo quando muitos chamam de isolamento social o ajuntamento familiar, eu prefiro apelidar de isolamento do mundo exterior. Durante este tempo, a casa passou a ser ainda mais o cantinho sagrado, onde todos se renovam e se revestem de outras atitudes na convivência em grupo. Pelo menos deveria ser assim.
Estas reflexões chegam agora quando me lembro da frase – onde é a nossa casa? –, que me parece de Albert Camus, este romancista e filósofo francês consagrado com o Prêmio Nobel de Literatura, para apontar que no tempo atual cada homem pergunta-se “onde é a sua casa”.
Não é apenas a casa de pedra e cal, mas a casa onde se encontram nossas hesitações, fadigas e as esperanças que carece de ser conservada e alimentada. Os caminhos até essa casa somos nós que construímos, mesmo que pedregosos ou extensos, mas neles entramos sabendo existir um facho luminoso que, mesmo distante, é para onde fixamos nosso olhar.
Assim como o Papa Francisco fala e pede para cuidar da “casa comum”, o filósofo francês tinha essa preocupação de mostrar os caminhos para se descobrir a casa. Devido aos embaraços do cotidiano, entramos por veredas escuras que tornam impossível observar a luz no seu final e conviver com a arquitetura da casa espiritual edificada para nós.
O caminho para encontrar essa casa está na busca silenciosa da madeira e dos tijolos usados na sua edificaçãoHabitação que se descobre na simplicidade, com sabedoria e paixão naquilo que propomos fazer. Entendendo que a casa somos nós, então responderemos ao que Camus escreveu: “no meio de um inverno, finalmente aprendi que havia dentro de mim um verão invencível”.
O poeta português José Tolentino Mendonça, cardeal integrante da Pastoral da Cultura no Vaticano, tem um bonito poema que fala, justamente, desse regresso a casa. Repito aqui apenas esses versos:
“A casa onde às vezes
regresso é tão distante
da que deixei pela manhã...”
regresso é tão distante
da que deixei pela manhã...”
O caminho para encontrar essa casa está na busca silenciosa da madeira e dos tijolos usados na sua edificação, que muitas vezes estão ao alcance das mãos e nem damos conta da sua importância. No livro, na música de Vivaldi e Mozart, por exemplo, ou numa escultura e pintura sempre encontramos o ambiente para essa casa a ser edificada. Mas às vezes deixamos de ser a casa para nos transformar na montanha inabitável.
José Nunes é poeta, escritor e membro do IHGP