Eu adoro palavra. Minha mãe era professora e fazia uma brincadeira comigo, quando eu era pequeno: Escrevia uma palavra qualquer (pato, por exemplo) numa folha de papel, depois me mandava procurar aquela palavra dentro de um texto.
Assim eu ficava sabendo como se escrevia a palavra PATO. Mas era mais que isso. Aquelas letrinhas faziam 'aparecer' um PATO na minha cabeça!
Era mágica! Mais fácil que desenhar. Eu fiquei com muita vontade de aprender mais palavras. Avião, girafa, pudim, açude, caju, serra, cidade...
A palavra é só de ida. Não tem volta. Mas tem um monte de palavra que vai e voltaEu adoro a palavra sozinha. Por exemplo: Você.
E a palavra junta: Você e eu.
A palavra que se junta no poema, no conto, na crônica, na história, na manchete, no outdoor, na bula do remédio, no bilhete, no quadrinho do gibi, na receita de macarronada.
Eu gosto da palavra que vem de fora: Impacto.
E da palavra que vem de dentro: Língua.
Para mim, palavra é mais forte que pensamento. Porque é preciso juntar muita palavra pra formar um pensamento. Mas uma só palavra pode criar pensamentos aos montes.
Eu gosto de pronunciar a palavra proparoxítona: Lúcida! Tímido. Paralelepípedo. Prática. Fálico.
Da palavra que saiu de uso: Lambe-lambe.
E da palavra nova. Selfie.
Da palavra que precisa voltar a ser usada. Gentileza.
E da que precisa sair de uso. Preconceito.
Tem palavra que alerta. Cuidado.
Que dá desejo. Gostoso.
Que mente. Eu.
Que amarga. Rícino.
Que é doce. Beijo.
Que é feia. Fronha.
Que fala a verdade. Olho.
Que tem cheiro. Chuva.
Que serve para lembrar. Fotografia.
Que vem de fora. Abajur.
Que vai pra fora. Pum.
Que se fala errado. Clitóris.
Que alivia. P---a!
A palavra é só de ida. Não tem volta. Mas tem um monte de palavra que vai e volta. Passagem, bumerangue, ioiô, opinião.
E tem poder. Falada. Escrita. Assinada.
Eu gosto de saber de onde a palavra vem. Por exemplo: Aperreado. Vem da Espanha e significa que alguém está ''cercado por perros'' (cães).
Mas tenho um pouco de medo de pra onde ela vai. Alma.
Eu amo a palavra PATO.
Porque depois que aprendi como se escreve, a palavra não me sai mais da cabeça. E é o meu brinquedo favorito.
Seja na ponta da língua, na ponta do lápis, nas pontas dos dedos.
Nelson Barros é psicólogo e cronista