Dizem que na prisão vê-se o Sol nascer quadrado… Decerto porque nas atuais cadeias as janelas têm tal forma. Nas de antigamente, talvez hou...

Lembranças na janela

Germano Romero Ambiente de Leitura Carlos Romero

Dizem que na prisão vê-se o Sol nascer quadrado… Decerto porque nas atuais cadeias as janelas têm tal forma. Nas de antigamente, talvez houvesse algumas redondas, como as náuticas, amoldadas ao Sol, ou sequer existissem. Mas a uma janela não importa geometria de contornos. Elas bastam por si só.

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Agora presos, ao temor da pandemia, vivemos de janelas, que ganharam uma vital importância cotidiana. E são tantas… dos mais variados tipos e formas. Janelas para o jardim, para o céu, para a rua, para o muro. Janelas para o mar, para a chuva, e para o Sol, sem ser quadrado.

Janelas para dentro. Infinitas. Janelas para o passado, para as boas lembranças... Evitemos as ruins, sofrimento não deve ter janela. A mente é um perigo. Não vale a pena abrir-lhe brecha alguma para a dor. Por ela não entra luz.

Das janelas das lembranças muitas outras hão de vir. E através delas tanta coisa boa pode entrar. O perdão, a compreensão, a tolerância. A reflexão que nos leva a aprender, entre erros e acertos, o caminho pra ser feliz. Quem pode imaginar a felicidade em meio a mágoas e ressentimentos? Mergulhado em memórias doloridas que insistem em voltar por um tipo de janelas que nunca devem ser abertas, e sim fechadas, lacradas, se possível demolidas.

Há ainda as janelas que se abrem na leitura. Sucessivas, se multiplicam a cada página, a cada reconstrução do imaginário moldado à emoção criada e recriada à cena literária.

E as janelas para a música, meu Deus!? Essa são abertas até mesmo aos que a vida desproveu da luz do olhar. São como as do olfato, do tato, do sabor, todas elas abrem brechas, paisagens da memória, do espírito, da existência…


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Allan Kardec
Importantes são as janelas dos sentimentos, por onde entram o amor, a compaixão e, sobretudo, o sábio olhar que nos permite compreender que retardamos o caminho da regeneração planetária, através da divisão social injusta, do egoísmo, das fronteiras criadas entre povos, com muralhas de racismo, preconceito, fanatismo, exploração da ignorância, sempre forjada pela supremacia do poder como meta de domínio. Um olhar que nos desvele a ciência e consciência de que tudo o que sofremos são reflexos da Lei de Causa e Efeito, fruto de um carma coletivo acumulado ao longo de milênios, de gerações em gerações, inexoravelmente construído. O que nos faz lembrar a máxima de Allan Kardec, ensinando que não há mal que se abrigue como mal na Inteligência Suprema, Causa Primária de todas as coisas: “O mal é o bem mal interpretado”. Ou seja, tudo se ampara na perfeição da Lei, para alguns, a “Vontade de Deus”, que tanto pedimos seja respeitada e compreendida quando oramos o “Pai Nosso”. E nem sempre aceitamos...

Bem-vindas as janelas! Que se abram nas paredes, nas lembranças, no porvir de infindáveis esperanças
Janelas para o mundo, para os mundos e galáxias, que sem vê-las de verdade chegam nítidas à ciência. Janelas ao mundo microscópico, de onde veio tão pequena dimensão e imensa virulência. Janelas para o infinito, dos dois mundos, micro e macro, que se encontram nos limites que de fato inexistem. E é nesse limiar que o Universo faz a curva, que une início e fim, referências pueris de um tempo que é eterno, desde que se imaginou existir algum começo.

Bem-vindas as janelas, todas elas! Que se abram nas paredes, nas lembranças, no porvir de infindáveis esperanças. Pois a Fé é que nos lembra de que tudo é passageiro, que o que vem também se finda, como toda essa luz que emana das estrelas, nascida e já morrida pelas bênçãos do Divino



Germano Romero é arquiteto e bacharel em música

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