Logo após o desembarque, os dedos pequeninos encontram o carinho da mão maior, que estará por perto e a postos ao longo de sua existência. ...

De mãos dadas


Logo após o desembarque, os dedos pequeninos encontram o carinho da mão maior, que estará por perto e a postos ao longo de sua existência. E aqueles dedinhos tornam-se um novo sentido para aquela vida que o esperava, mudam rota, reviram planos. Meses antes, planejado ou não, a mãozinha é realidade, fantasia, sonho, amor, espera, gestação.

E perceberão que aquela mão cada vez mais envelhecida e enrugada desde o primeiro encontro permanecerá fiel, vigilante
E no caminho já testa sua resistência com chutinhos, causa de enjoos, contrações, dores. Entende que a mão que o espera une todos os pré-requisitos e atributos, um sem número de qualidades: força, paciência, serenidade, compreensão, controle, limites e até impaciência.

Em geral, a mão maior não demonstra preferência, pede apenas que o novo ser chegue bem, que seja luz. Na verdade, nem percebe ser ela a própria luz, refletida naquele pequena mão que chega, chora, mama, dorme.

Disposta a cuidar, doa-se a ponto de esquecer de si mesma. Jamais ela estará distante. É possível senti-la a cada arrastar-se ou passada dada ao longo dos anos do que se chama crescimento. Desde os primeiros momentos, impulsionado pela força que a vida confere a qualquer ser de busca o novo, sim, ela terá a mão próxima para evitar a queda, amenizar os impactos, direcionar para o bom caminho. Sofrerá com a febre noturna, o machucado da queda, se culpará quando não conseguir evitar o tombo.

Ela provavelmente estará ali quando os pés fixarem o chão, as pernas fortalecidas mostrarem equilíbrio e demonstrarem sincronismo suficiente para as primeiras conquistas. Será motivo de emoção, até de choro. O mesmo ritual se repetirá na primeira palavra dada, quase que certamente um "mama" meio que desconexo, mas já de reconhecimento, talvez o primeiro obrigado.

O vocabulário será ampliado. Os pequenos dedinhos que mal conseguiam agarrar aquela mão doce e suave que o aguardava crescerão, se fortalecerão. E perceberão que aquela mão cada vez mais envelhecida e enrugada desde o primeiro encontro permanecerá fiel, vigilante. Capaz de transmutar-se em fera para proteger sua criação.

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Deseja permanecer o máximo de tempo possível ao lado do que percebe como um pedaço de si mesma
m adendo. Quando falo do primeiro encontro entre os pequenos dedinhos e a mão protetora, refiro-me a todas as mãos femininas, as que viram brotar no ventre a sementinha, como as que já a colhera após esta chegar neste plano. Tanto chamadas de naturais como as que se deixaram adotar pela mãozinha, sem exceção.

Sim, jamais passará a ideia de deixar ir-se após a sua criação. Considera que isso é injusto, antinatural, inaceitável. Crê na sequência lógica do rito da vida. Deseja permanecer o máximo de tempo possível ao lado do que percebe como um pedaço de si mesma, mas isso desde que não ultrapasse o tempo deste.

E quando chegar a hora de ir-se, ainda estará se doando, preocupada em como soltará a mão que ajudou a criar. E nem perceberá que essas mãos não se soltarão jamais, pois foram feitas para ultrapassar os limites do tempo e do espaço.

Às mães, o máximo obrigado sempre será pouco. Mas precisa ser repetido. Obrigado mãe.


Clóvis Roberto é jornalista e cronista

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