Ler é uma das melhores condições em que me vejo. Ler faz parte de minha saúde mental e profissional. LER, não. Ela faz oposição ferrenha e dolorosa ao movimento de passar uma página do livro, ao ato de acessar as plataformas digitais, e ao toque dos dedos nos nossos teclados contemporâneos, virtuais.
Assim como tenta impedir que você leia, pela tortura da dor, impõe que você não escreva o que outros poderiam ler. A LER, portanto, é a anti-leitura.
Maldosa, mancomunada com tendões, nervos, músculos e ligamentos que ela inflamou contra ti, te persegue o dia todo e, à noite, costuma conjugar, com mais vigor, seu verbo onipresente: o intransitivo ‘latejar’. Dormir? Se liga, ela não vai desligar! E não adianta pensar num mar de histórias para afastar-se de sua sanha de insônia. Ela dói, dói, dói, dói, dói, dói, a cada segundo em que sua onda vai e vem.
A LER é o pior dos verdugos: faz você perder a cabeça sem nem mesmo te decapitar.
O médico diz que ela pode estar associada a algo mais crítico – tendinite, artrite, bursite? Como odiei essas rimas tristes! – e sugere uma leitura mais profunda do braço alquebrado, por meio de uma tomografia computadorizada. Mas avisa: pelo SUS, pode demorar! – como a dizer que, se eu não tomar uma iniciativa privada, deverá ser uma leitura a longo prazo. Literalmente.
Injeções e comprimidos até atenuam a sua tortuosa tática. Mas a desgraçada da LER dói, dói, dói, dói, dói, dói, ainda que esteja um tanto dopada.
Com a mesma intensidade que adoro ler, eu odeio a LER. Para tentar potencializar minha resiliência, em proporção extensiva, contra tudo o que ela faz para eu não ler bem. Nem, assim, viver.
Maldita LER! Tomara que ela tenha uma Lesão por Esforço Repetitivo de tanto bater na mesma tecla de uma dor alheia da qual tanto necessita.
Maldita, maldita, maldita LER.