Depois de apresentar o pianista ao público, o maestro subiu ao tablado para dar início ao concerto. Aí eu notei uma coisa estranha. Notei que o solista tinha os olhos parados, isto é, que ele era um deficiente visual. Como iria ele movimentar suas mãos pelo teclado? Como era possível tocar piano sem os olhos? Agora é lembrar aquela sentença evangélica: tudo é possível àquele que crê.
E teve início a performance sob a batuta serena e elegante do maestro. E eu tive uma certa ansiedade. Será que esse jovem vai mesmo tocar sem os olhos? Pois não é que tocou, leitor? Alaurinda, Germano e Davi, ao meu lado, ficaram maravilhados. Terminado o concerto, caiu uma trovoada de palmas.
O pianista, como disse acima, deu uma grande lição de fé na vida, vencendo uma deficiência física que, em outros, talvez fosse motivo de revolta. Mas, ele soube vencer as limitações da existência, eis a grande virtude do homem. E me lembrei do velho Beethoven, que apesar da surdez, conseguiu ir até o fim da jornada terrena deixando uma obra insuperável, cuja Nona Sinfonia é um hino de fé, de alegria e de muito amor.
Terminado o concerto, o jovem pianista veio várias vezes ao palco, agradecendo os ruidosos aplausos da platéia. Saí do teatro com a alma leve. Eu não tinha ouvido um concerto. Mais do que isto: eu tinha assistido a uma lição de vida!