N ão sei porque andei me lembrando do livreiro Bartolomeu e de sua livraria… A memória tem dessas coisas. Às vezes, de repente, ou através d...

Saudade que dói

Não sei porque andei me lembrando do livreiro Bartolomeu e de sua livraria… A memória tem dessas coisas. Às vezes, de repente, ou através do sonho, chegam-nos as lembranças. Boas ou más. Fiquemos com as boas.

Bartolomeu ficou um tempo doente, em sua casa na Avenida Tabajaras. E eu nunca me perdoei por não ter ido fazer uma visita ao gordo, que levou a vida vendendo livros e fazendo amigos. O tempo foi passando, e não fiz a visita desejada. Logo depois, me chegou a notícia de que ele saíra deste mundo, o que me sensibilizou bastante. Senti o gosto amargo de uma saudade misturada ao remorso de não ter ido vê-lo.

Bartolomeu foi um grande amigo, aqui neste mundo. Um homem simples, humilde, que, apesar de não ser culto, sabia cultuar a literatura. Sua livraria, a princípio, situada na rua Duque de Caxias, terminou desaguando na avenida Tabajaras. Fui várias vezes visitá-lo. Sozinho, uma ilha de bondade cercada de livros por todos os lados. E como sabia do meu gosto literário! Pena que não quisesse vender o livro que me interessava. “Leve este, é um presente!"... Sempre com um sorriso nos lábios. Sempre de bom humor. Sempre feliz na sua vida modesta de vendedor de livros, que nunca pensou em se aposentar. Que nunca se acostumou com a inatividade.

Bartolomeu de Oliveira. Este o seu nome de registro. Mas, para mim ele era “Bartola”. Um amigo de verdade, que nunca soube guardar ressentimentos, nem ódio, nem vaidade.

Fecho os olhos e parece que estou vendo nosso “Bartola” na livraria, vez por outra, com o espanador na mão, tirando a poeira dos livros. E quando eu chegava na sua oficina de trabalho, lá vinha ele com uma novidade. Sabia do meu gosto literário. Lia minhas crônicas. Estava sempre em dia com os acontecimentos. Fazia sua crítica com muito bom humor.

E fico pensando: será que o meu querido Bartolomeu deixou inimigos? Evidente que não. Impossível não gostar dele. E para os muitos amigos que, decerto, deixou, deve ser uma boa lembrança, como a que tenho dele.

Agora vai esta confissão: o nosso livreiro deu muitos livros aos alunos que não podiam comprá-los. E teve um casamento feliz com Carmelita, que muito o incentivou na vida.

Fui à Igreja do Carmo, onde se realizava a missa em louvor de sua alma, que, e saí de lá certo de que ele estaria num excelente lugar e com a consciência em paz.

Agora, abram o Evangelho e leiam o Sermão da Montanha, onde se diz: “bem-aventurados os humildes por que deles é o Reino dos Céus”, o reino da paz interior.

Pois é, andei desejando que a partida de meu amigo Bartolomeu não passasse de um sonho, de um pesadelo e ir à sua livraria, lá na Avenida Tabajaras, encontrá-lo sorrindo e me dizendo: “que fim você levou, rapaz? Já estava com saudades...”

Não, meu querido Bartola, quem está com muita saudade de você, agora, sou eu. Uma saudade de doer.

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