E onde não existe barulho? No fundo do mar, na Natureza, nos mosteiros, no nosso corpo, este maravilhoso templo de carne e osso que Deus nos deu. O sangue corre numa mudez admirável, os pulmões respiram sem incomodar ninguém, o coração idem, a digestão se processa também em silêncio, o mesmo diríamos do cérebro.
E a Natureza? Haverá maior silêncio do que as flores se abrindo, das árvores que o vento agita. Estou, aqui, no jardim, as borboletas beijam as flores e, sem dúvida, murmuram palavras de amor...
O mar, os rios, os lagos são lugares de muito silêncio. O homem é que adora barulho. Por que? Deve ser para esquecer os problemas de consciência, pois o silêncio faz você pensar, conversar consigo mesmo. Por incrível que pareça, há religiões que adoram o barulho, esquecidas de que Deus pede silêncio. Bem disse a missionária Tereza de Calcutá: “Não se pode encontrar Deus no barulho”...
Estive lendo este relato sobre Viena, a propósito de seu tradicional silêncio: “Quando Mozart compunha, no século XVIII, a cidade de Viena era tão silenciosa que um alarme de incêndio podia ser dado por um vigia gritando do alto da Catedral de São Estevão”. Evidente que hoje ainda é quase assim.
Continuando, também fui informado que as aranhas colocam nos fios da teia um liquido que amortece o barulho lá fora.
Um dos momentos de nossa vida mais importante é, sem favor, a hora da refeição, que deveria ser sem conversa alta, gargalhada e discussões... Lembrar que a refeição é um ato que tem muito de religioso.
Mas bom mesmo é o silêncio. É com ele que a gente conversa consigo mesmo. Acontece que muita gente vive correndo de si mesma, por isso adora barulho.
Passo a vista na biblioteca e todos os livros estão em silêncio. Que maravilha. Livraria é outro lugar de silêncio. Ninguém lê, nem estuda, nem reflete com zoada. E entre os livros que estou olhando, vejo um de Shakespeare, que é uma maravilha de título: “Muito barulho por nada”. Hoje, ele escreveria: ”Muito barulho por tudo”. Assim morasse em João Pessoa.
Aqui para nós: só gosta de zoada quem não tem nada na cabeça. Vale-se do barulho para esquecer sua vacuidade, seu vazio, seus recalques, suas frustrações. Fui a um restaurante, uma noite dessas, e sai de lá surdo, tal era o barulho. Fiquei impressionado. Saí, para nunca mais voltar lá.
E agora, com a campanha eleitora, é a hora de tapar os ouvidos com algodão e não votar em político barulhento. Vamos observar.
E este computador? Que silêncio no bater de suas teclas. Estou quase beijando-o. Que diferença da TV!
Mas vou encerrar a crônica. A tarde está muito silenciosa. Gostaria de ir até o mar e vê-lo brincando com as ondas. É aí que o mar se torna menino.
Meu medo é que estronde, aqui na avenida, um carro de propaganda eleitoral. Fui falar, pois não é que surgiu o que eu temia. Propaganda de um candidato não sei a quê...