Terminamos de assistir à terceira temporada dessa Série, “The White Lotus” (Direção Mike White), que bombou mundo afora. A Série tem como foco os ricos americanos. Uma crítica feroz ao modo de viver desse povo, em lugares escolhidos a dedo, para daí o desenrolar dos enredos esdrúxulos e violentos. Na primeira temporada, tivemos como setting, o Havai e a sua beleza dos mares e das canoas. A trilha sonora é sempre uma beleza à parte. A segunda, se passou na Sicília, e as ruelas e as sombras dos mafiosos e dos chefões. E a terceira, na Tailândia, com os templos, os macacos, e a beleza calma de cinema. Muito se criticou essa última, pelo ritmo e demora para o clímax, mas eu gostei. Da lentidão, dos temas, dos desenhos eróticos e assustadores da abertura, e mais uma vez, da trilha sonora.
De uma forma bem superficial, tínhamos um segurança que não dava para defender, e tinha medo de arma, com a sua namorada ambiciosa a pressioná-lo de dia e a dançar para os hóspedes, com flores no cabelo à; uma família tóxica, a mãe medicada e com um sotaque hilário, o pai a ganhar dinheiro suspeito, a filha sondando uma vida simples num mosteiro , mas logo viu que sentiria falta de tudo, e os dois irmãos que, com os hormônios à flor da pele, se entregam a uma cena de masturbação que beirou um incesto possível. Um casal cult, com uma mocinha dentuça e o namorado charmoso, mas deslocado e atormentado; uma mãe e filho, ela que já vem da temporada anterior e tem informações importantes e guarda segredos para o último capítulo; e três amigas ricas que há muito não se veem e decidem passar essa semana na intimidade desse luxuoso resort.
Cena do seriado White Lotus HBO
Todos os 8 episódios mostram essas amigas, em retiro para diversão. A relação entre elas parece um pouco disfuncional a um certo momento, como se escondesse alguma coisa. Um ressentimento talvez? Elas se provocam, e as picuinhas vão envenenando a relação das três, comprovando a tal da rivalidade feminina, propagada desde sempre.
É justamente essa amizade dessas amigas que foco aqui. A vida toda somos ensinadas que amigas competem, não dissimuladas, e que não devemos confiar nelas. Adultas, aprendemos que, essa armadilha não foi criada pelas mulheres, mas pelo patriarcado e dado continuidade pela sociedade machista. A força feminina há de se ter cuidado. A sororidade então, abram o olho! As personagens de Carrie Coon, (Laurie), Michelle Monaghan (Jaclyn) e Leslie Bibb (Kate), embora sejam representadas um pouco de forma clichê: histórias incluem ciúmes, fofocas e uma aventura amorosa de férias, também trazem histórias passadas nos tempos de colégio onde a beleza, a timidez, a arrogância, por vezes magoaram e magoam até hoje.
Cena do seriado White Lotus HBO
No último episódio as três amigas se despedem num jantar, no qual Kate, a mais apaziguadora, e Jaclyn a mais dissimulada, fazem um retrospecto das férias, passando o pano, e realçando os pontos positivos da jornada. Mas aí Laurie, se diz triste com todas as decepções que viveu com as amigas. O seu discurso é sobre a vida e da amizade delas. A Laurie confessa que na sua vida, o trabalho, o casamento, a maternidade, tudo não foi tão maravilhoso assim, e o que fica é a importância do tempo. E ela reforça que, estar aqui na mesa com vocês, é o que vale. Quando olho para vocês, me vejo e vejo o tempo. Nessa troca, a Laurie constata sobre falhas, silêncios, e sobre ela mesma, e o significado do que seja se encontrar com amigas nessa vida. Quem caminha conosco! Nossas amigas de infância, ou da vida adulta. Eu muito me emocionei com a fala de Laurie, me tocou fundo. O que parecia superficialidade, frivolidade, se torna em algo complexo e subjetivo. E essa fala de Laurie se torna um tributo à amizade entre mulheres.
Laurie, em White Lotus HBO
Fiquei a lembrar dos meus tempos das antigas. A mãe implicava com as amigas, e estava sempre a encontrar defeitos com o olhar de suspeita. E os namorados? A primeira coisa que se estabelecia tacitamente era que, as amigas deveriam se afastadas. Claro que nunca me afastei assim acintosamente, mas a própria vida e interesses o faziam por mim. Quando encontrava algum casal mais difícil, por assim dizer, a primeira coisa no manual da opressão era o afastamento da namorada das amigas. Uma vez, um deles proibiu a namorada de ficar comigo no colégio. Imaginem o perigo, um cochicho na hora do recreio, o que isso poderia dar influenciar à sua namorada, presa aos caprichos de uma relação que cerceava a liberdade desde cedo.
Bebé, Ana Adelaide, Claude e Teca Peixoto (irmãs) Acervo da autora
Hoje tenho grupos de amigas de infância; de amigas feministas; de amigas recentes, e lugar especial para todas. Claro que amiga de perto, íntima, essas são poucas. E preciosas. Mas poder conversar com mulheres, trocar ideias da vida, tudo isso é puro luxo. Fico muito feliz de ver as mulheres de hoje com seus grupos de maternidade, de leitura, de cultura, de viagens, de amores. Os podcasts tantos que ouço atentamente e interajo nas minhas noites silenciosas, ou nos domingos mais calados. Como é importante ter esse mundo feminino ao meu redor.
E as amigas mais presentes e imprescindíveis são as minhas irmãs. Obrigada queridas.